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Das gomas com nutrientes ao chocolate de microalgas. Startups e investigadores estão a mudar a alimentação

“Temos de mudar. Os nossos sistemas alimentares vão ter de mudar, porque os enormes desafios que existem neste momento para a sociedade são prementes”, alertou esta terça-feira Paulo Monteiro Marques, administrador da associação Colab4Food e assessor da direção da Sumol+Compal.
21 Março 2023, 11h35

“Os três maiores problemas do futuro do sector agroalimentar – segurança alimentar, saúde e sustentabilidade – só se resolvem com tecnologia e ciência”. Palavras de biólogo espanhol Daniel Ramón Vidal, a quem coube o pontapé de saída da conferência Dare2Change, que decorre esta esta terça-feira no Porto e reúne académicos e especialistas em inovação e alimentação.

Daniel Ramón Vidal alertou que as alterações demográficas no mundo, entre as quais o aumento da densidade populacional e a crise de infertilidade, geraram um desafio adicional para quem trabalha no sector da alimentação.

Primeiro, pelo fator mais previsível da sustentabilidade, porque até ao final de 2023 metade da superfície do planeta estará ocupada por cidades ou terras de cultivo e há 200 anos havia só seis cidades com mais de um milhão de habitantes (Nova Iorque, Londres, Tóquio, Pequim, Berlim e Paris) enquanto atualmente são mais de 450.

Depois, uma condição menos óbvia: sem filhos, as famílias começaram a ter mais animais de estimação. Por exemplo, em Espanha a comida para animais domésticos cresceu 6% nos últimos três anos, mencionou o investigador. Logo, produzir de forma mais sustentável só é possível com o trabalho da academia e de quem desenvolve tecnologia (nanotecnologia, robótica, Inteligência Artificial, genómica, fermentação precisa…).

Como? Daniel Ramón Vidal sugere que atentemos no caso da startup portuguesa Chrysea Labs, financiada em quase 4 milhões de euros pelo Banco de Fomento, fundada em Cantanhede há três anos por Pedro Noronha, Patrick Keohane e Jenns Nielsen. O trio de peritos em biologia sintética trabalha com moléculas para nutrição de precisão, que “são metabolitos naturais que induzem a autofagia nos nossos corpos, ajudando a limpar os detritos celulares e estimulando a regeneração celular essencial para um envelhecimento saudável”, como descreveu o presidente da Juvlife.

Na montra de inovações, no centro de congressos Super Bock Arena, está também o projeto de chocolate branco com microalgas, criado por investigadores da associação Colab4Food. Basicamente, bombons com tetraselmis (género de fitopláncton) incorporado numa base de 2% de chocolate branco e matcha. O Jornal Económico testemunhou a prova de alguns participantes no evento e a opinião pareceu unânime: o sabor é bom, mas é diferente do chocolate que todos conhecemos. A verdade é que a ideia não é ser só mais um chocolate, mas sim ser o primeiro produto de chocolate no mercado que realce o sabor das algas.

Entre os exemplos de sucesso referidos esteve também a britânica Nourished, que faz suplementos alimentares personalizados à maneira como a pessoa se está a sentir naquele dia/semana e às suas necessidades nutricionais. Através de uma impressora 3D, cria gomas à imagem do sistema imunitário do consumidor. A empresa foi fundada e liderada pela empreendedora Melissa Snover, que em 2018, quando estava no aeroporto prestes a embarcar numa nova viagem de trabalho, deixa cair os fracos dos suplementos que tinha na mala em plena zona de controlo de segurança. Depois de apanhar as cápsulas e compridos um a um do chão, percebeu que tinha de mudar o modelo de consumo da suplementação, tornando-a mais prática para quem nem sempre está em casa.

“Temos de mudar. Penso que ninguém aqui tem dúvidas de que os nossos sistemas alimentares vão ter de mudar, porque os enormes desafios que existem neste momento para a sociedade são prementes”, afirmou Paulo Monteiro Marques, membro do conselho de administração do Colab4Food e assessor da direção da Sumol+Compal.

“Em Portugal, falo da sustentabilidade dos sistemas de saúde – em que sabemos que a prevenção é um dos fatores e que os sistemas alimentares e o acesso a alimentos saudáveis têm uma importância enorme – ou da redução de emissões. Mais análise e mais estatística não vai chegar. Temos de ir por outras vias, em termos de criação das nossas possibilidades estratégicas: olhar para os terrenos onde queremos estar, para categorias de produtos diferenciados e com targets de consumidores…”, explicou, na conferência coorganizada pela PortugalFoods, pelo Colab4Food – Laboratório Colaborativo Para a Inovação da Indústria Agroalimentar e pelo INIAV – Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária.

Ainda assim, o professor catedrático José António Teixeira, diretor do Centro de Engenharia Biológica da Universidade do Minho e administrador do Colab4Food, admite: “Hoje falamos de forma muito diferente com as empresas. Antes, éramos nós que tínhamos de ir falar com elas e perguntar «não querem fazer isto?» e agora vêm ter connosco”.

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