Aproxima-se o debate na especialidade da proposta de Orçamento do Estado, do qual se espera muito mais substância – com apresentação de alternativas concretas – que  a expressa nas meras posições críticas “standardizadas” e pontuais na abordagem na generalidade, sobretudo pelo partido líder da oposição, o PSD, “encalacrado” que parece estar com o acordo de rendimentos e competitividade e, claro, com as “contas certas”.

Mas hoje aproveito esta coluna de opinião para destacar algumas das minhas maiores preocupações – fora do próprio debate orçamental – necessariamente não exclusivas (basta pensar na saúde, habitação, educação, segurança social, justiça, etc.) no contexto dos problemas que o país enfrenta. Com a consciência desta limitação, não deixo de adiantar algo aleatoriamente os seguintes temas como desafios que são:

1. Sou dos que concordam com as palavras proferidas pelo ministro da Economia, António Costa Silva, aquando, creio, dum evento empresarial, onde com frontalidade defendeu que as bases para um crescimento económico sustentado exigem na sociedade uma cultura que não considere “pecado” o lucro, não veja com bons olhos empresas grandes – mesmo globais – fruto de acções de capitalização, redimensionamento/cooperação e, muito particularmente, da captação de investimento estrangeiro estruturante, já que a base de capital existente no país é exígua.

Não desvalorizemos, no entanto, o que o primeiro-ministro, numa das suas intervenções a propósito do Orçamento, referiu ser intenção do Governo o robustecimento do tecido empresarial, que permita que as pequenas e médias empresas se tornem grandes e algumas destas mesmo globais.

Falta, contudo, no nosso país uma cultura generalizada que melhor enquadre a livre iniciativa empresarial, com explicitação da sua essencialidade em termos do crescimento económico, o que exigirá mudanças de mentalidade não só do Estado mas também dos próprios agentes empresariais, no sentido de ser claramente percepcionada cá dentro e lá fora (como factor captador do necessário investimento estrangeiro). Não se trata só de providenciar benefícios fiscais e novas linhas de crédito – e ambos terão que ser sempre prudentes – mas sim a criação dum contexto mais dinâmico, inovador, mais aberto à cooperação e menos burocrático, ainda que com a regulação adequada.

Não é que não exista esta sensibilidade de momento no país, mas falta-lhe alguma força!

2. A segunda preocupação que me inquieta é a necessidade de termos um Estado que preste duma forma pouco burocrática serviços públicos com qualidade e eficiência nos diversos domínios.

O peso da Administração Pública –  designadamente em termos de recursos humanos – é considerável e tem vindo a crescer. Mas interrogo-me sobre a massa crítica existente no que toca a quadros técnicos especializados que auferem renumerações – mesmo tendo em conta os recentes acordos de ajustamento – que claramente fomentam a sua transferência para o setor privado. Ora, um Estado sem uma elite de técnicos qualificados e experientes nunca será um bom prestador de serviços.

Claro que existindo uma larga base de trabalhadores com baixos rendimentos na Administração Pública, haverá sempre que atenuar os efeitos que sofrem, sobretudo, na actual conjuntura. Mas tal não pode ser à custa do “orçamento” dos quadros superiores, para os quais se devem estabelecer selectivamente carreiras consistentes e atractivas.

3. Finalmente uma preocupação que tem que estar sempre presente: os elevados níveis de pobreza – a diversos níveis das condições de vida – que ainda “sufocam2 a economia portuguesa. Obviamente que tal exige, por parte dos governos, uma apurada sensibilidade social de forma a salvaguardar aquelas classes com maior vulnerabilidade, através de diversas prestações sociais já concretizadas que, no entanto, serão sempre limitadas.

Mas neste domínio não deve haver resignação! Temos que interiorizar a médio prazo (ver ponto 1.) que só um clima de franco crescimento económico (com aumento da produtividade média), sustentado num upgrade empresarial, constituirá um suporte para se vencer com maior intensidade as situações de pobreza, na medida em que se aumenta a criação de riqueza, o potencial de inovação e exportador e se criam condições para auferir melhores salários. Em suma, o próprio reforço do Estado Social.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.