E agora?

Será a pergunta que terá ecoado, uma vez conhecido o recente acórdão do Tribunal Constitucional que declarou a inconstitucionalidade da agora já famosa lei dos metadados, por violação dos princípios da proporcionalidade e da intimidade da vida privada, constitucionalmente garantidos na nossa Lei Fundamental.

É palpável a tensão e o receio em face das mais que prováveis consequências da decisão em processos pendentes e, mesmo, em relação a casos já transitados em julgado.

Lembremos, brevemente, o que está em causa.

A referência geral a metadados respeita, desde logo, a dados de tráfego de chamadas realizadas em telemóvel e de comunicações, em computador, por endereço de IP. Neles se incluem o momento da sua realização, a sua duração e localização, assim como a identidade dos interlocutores.

Excluído do âmbito destes dados se encontra o conteúdo das comunicações promovidas por qualquer daqueles meios, sujeita que está a autorização e a controlo judicial, no contexto de recolha de prova admitida apenas em processo penal.

Ponto fundamental nesta lei respeita ao facto das operadoras de serviços de fornecimento de comunicações se encontrarem obrigadas a conservar os ditos metadados por um período de um ano.

Para compreender a razão de ser desta exigência, haverá que retomar o fio à memória e recuar ao tempo da criação desta lei.

Estávamos no rescaldo dos atentados de Londres e de Madrid e esta lei, bem como o aparato regulatório da União em que ela se sustenta, integra um vasto arsenal de instrumentos legais e institucionais que visavam reforçar a capacidade dos países da União de prevenir e de combater a prática de crimes de terrorismo nas ruas das capitais europeias.

No entanto, a guarda de dados de tráfego de todas as comunicações, de todos os clientes durante um ano, explicável, como facilmente será, à luz daquelas preocupações, importava também a possibilidade de acesso pelas autoridades policiais e judiciárias, de forma indiscriminada, a todos os metadados. Independentemente de respeitarem a comunicações entre suspeitos da prática de crimes, desde logo de terrorismo.

Por isso, a pronúncia de inconstitucionalidade do Tribunal Constitucional e, também por isso, os efeitos que terão seguramente em processos pendentes em tribunais por todo o país.

E ainda os efeitos dessa decisão sobre processos penais já transitados em julgado, em sede de revisão de sentença condenatória.

Tudo era, na verdade, previsível, dizem, quando o Tribunal de Justiça da União, há oito anos, se havia pronunciado nesse sentido.

Ora, se essa lei não vale numa democracia, será precisamente porque a liberdade não pode soçobrar perante o medo que nos possam fazer todos aqueles que odeiam a liberdade.

Terão ganho esses, se, por ódio, nos privarem daquilo que, por medo deles, abdicamos. Da nossa liberdade.