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“Espiral de insatisfação e exaustão”. 416 médicos internos escusam-se de responsabilidade

Numa carta aberta dirigida à ministra da Saúde, Marta Temido, mais de 400 internos de Medicina Interna relatam indisponibilidade para serem ultrapassados os limites legais de trabalho suplementar, fixados nas 150 horas por ano.
19 Agosto 2022, 19h38

Mais de 400 médicos internos da especialidade de Medicina Interna entregaram esta sexta-feira uma carta aberta à ministra da Saúde onde apresentam escusas de responsabilidade. A carta contém também minutas que dão conta de uma indisponibilidade para serem ultrapassados os atuais limites legais de trabalho suplementar desempenhado, que se fixam nas 150 horas por ano.

No documento disponibilizado pelo Sindicato Independente dos Médicos, os signatários relatam que se tem vindo a “multiplicar o recurso a internos de Medicina Interna, muitas vezes para preencher turnos de especialista das escalas de urgência”. A prática, dizem, tem-se tornado “um hábito”.

À luz desta prática, os 416 médicos escudam-se nas considerações recentes do Colégio de Especialidade de Medicina Interna (CEMI), que defende que a utilização de internos de quinto ano para colmatar as necessidades dos recursos humanos hospitalares só deve ser admitita em situações “muito particulares e excecionais”. Além disso, o esclarecimento do CEMI diz que essa prática depende de supervisão de um internista e que não pode ser um recurso “para resolver problemas de escalas médicas há muito potencialmente antecipáveis”.

Segundo a carta entregue, a propagação e normalização desta prática tem resultado num “prejuízo da formação” por impedir que os médicos internos afetados cumpram “os números mínimos exigidos”, nomeadamente de consultas, técnicas, publicação de artigos e trabalho de investigação e participação em ensaios clínicos.

Os profissionais alegam ainda que esta “utilização abusiva dos internos para colmatar falhas nas escalas” leva à ultrapassagem “de horas extraordinárias muito além das 150 horas anuais obrigatórias”, o que prejudica também a “própria vida pessoal e familiar”, cita ainda a carta.

“Esta espiral de insatisfação vai-se agravando todos os dias e é comum a várias especialidades médicas. O sentimento de exaustão e incompreensão a que os internos de todo o país estão sujeitos vai-se alastrando. Esta pressão que todos sentimos resulta de não haver especialistas suficientes nos Serviços de Urgência, fazendo com que o caminho mais fácil seja a “utilização” abusiva dos internos para colmatar falhas nas escalas, resultando na multiplicação de horas extraordinárias muito para além das 150 horas anuais obrigatórias”, pode ler-se na carta.

Levantam-se também questões quanto à remuneração proposta para esse trabalho suplementar, que os médicos internos consideram não se coadunar “com o nível de diferenciação e responsailidade que o médico interno detém”, numa altura em que os salários, dizem, estão “estagnados há vários anos”.

Foi neste contexto que os 416 médicos informaram que será entregue junto das administrações hospitalares a “recusa de realização de mais de 150 horas extra por ano”, bem como minutas de “escusa de responsabilidade sempre que estivermos destacados para trabalho em urgência e as escalas de urgência não estiverem de acordo” com o que está regulamentado.

O documento aproveita ainda para reivindicar “melhores condições formativas e de trabalho” e para apontar a uma “espiral de insatisfação, (…) exaustão e incompreensão”.

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