Ativistas antiaborto e defensores dos direitos do aborto manifestaram-se em Washington esta terça-feira na sequência das notícias de que o Supremo Tribunal americano deve derrubar a decisão “Roe vs Wade”, de 1973, que legalizou o aborto em todo o país. Também dentro do sistema político foram várias as reações, a favor e contra, ao anúncio da decisão. Outra polémica é que esta é a primeira vez que foi quebrada a confidencialidade de um processo ainda em curso no Supremo Tribunal dos EUA. A decisão final só será conhecida em junho.
A notícia foi avançada, na segunda-feira, pelo “Politico” que divulgou um rascunho inicial da opinião da maioria de seis republicanos para três democratas no Supremo (conseguida durante o mandato de Donald Trump). A “Reuters” afirma que não conseguiu confirmar ainda a autenticidade do projeto de parecer. Tanto o Tribunal como a Casa Branca recusaram-se a comentar.
O aborto é uma das questões mais polémicas e divisivas na política dos EUA. Um inquérito do Pew Research Center revelou que, em 2021, 59% dos adultos americanos acreditavam que deveria ser legal em todos ou na maioria dos casos, enquanto 39% achavam que deveria ser ilegal na maioria ou em todos os casos.
Esta terça-feira, nas ruas da capital americana, ativistas antiaborto gritaram “hey, hey, ho, ho, Roe v. Wade has to go [tem de acabar]”, enquanto que os defensores do direito ao aborto respondiam com “aborto é saúde” do lado de fora do Supremo Tribunal, numa confrontação que espelhou a divisão entre republicanos e democratas.
Destaque ainda para o timing desta fuga de informação: em novembro vão ocorrer eleições que determinarão se os democratas mantêm as maiorias no Congresso dos EUA nos próximos dois anos de mandato de Joe Biden. Uma notícia destas tem, assim, o potencial de remodelar o cenário político, e dar vantagem legislativa aos republicanos.
Mas é de destacar que, entre a votação inicial e a decisão final, o sentido de voto pode mudar uma vez que a decisão só é definitiva quando é publicada pelo tribunal. No que ao “Roe vs Wade” diz respeito, será até ao final de junho. Os republicanos já criticaram a fuga de informação, sugerindo que é uma tentativa de pressionar o tribunal a mudar a orientação, enquanto os democratas se insurgiram contra o conteúdo da moção.
A “Reuters” sublinha que, caso a decisão de 1973 seja derrubada, o aborto deve permanecer legal nos estados considerados mais liberais, uma vez que mais de uma dúzia têm leis que protegem o direito ao aborto. Contudo, nos últimos anos vários estados republicanos aprovaram várias restrições ao aborto e espera-se que a tendência se alastre e se consolide.
“Roe estava flagrantemente errado desde o início”, escreveu o juiz conservador Samuel Alito no rascunho do parecer, datado de 10 de fevereiro. Com base na sua opinião, o Tribunal considera que a decisão “Roe v. Wade”, que permite abortos realizados antes de um feto ser viável fora do útero (entre as 24 e 28 semanas de gravidez), é errada porque a Constituição não faz menção específica a esse direito.
“O aborto é uma profunda questão moral. A Constituição não proíbe os cidadãos de cada estado de regular ou proibir o aborto”, continua Alito, segundo o documento divulgado.
Dentro do sistema governativo bipartidário, são flagrantes as divisões.
Num comunicado conjunto, a presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, e o líder da maioria do Senado, Chuck Schumer, ambos democratas, criticaram a decisão: “Os votos dos juízes nomeados pelos republicanos para derrubar Roe v. Wade seriam considerados uma abominação, uma das piores e mais danosas decisões da história moderna”.
“Vários destes juízes conservadores, que não prestam contas ao povo americano, mentiram ao Senado dos EUA, rasgaram a Constituição e mancharam tanto o precedente quanto a reputação do Supremo Tribunal – tudo às custas de dezenas de milhões de mulheres que em breve podem ser despojadas da sua autonomia corporal e dos direitos constitucionais em que confiaram por meio século”, acrescentaram.
Por sua vez, o senador republicano Josh Hawley disse que a esquerda continua a atacar o “Supremo Tribunal com uma quebra de confidencialidade sem precedentes, claramente destinada a intimidar. Os juízes não devem ceder a essa tentativa de corromper o processo”. “Se esta é a opinião do tribunal, é uma opinião e tanto. Pesquisa volumosa, bem argumentada e moralmente poderosa”, defendeu.
Na mesma linha, o seu colega Tom Cotton defende uma investigação rigorosa e que “o Tribunal siga a Constituição e permita que os estados protejam novamente os fetos”, segundo a “Reuters”.
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