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Francisca Van Dunem. Seis anos marcados estratégia para o combate à corrupção e pelo “lamentável” “caso Guerra”

Van Dunem sai quase diretamente para a reforma como juíza conselheira do Supremo Tribunal de Justiça, depois de seis anos como ministra da Justiça e de ter, ainda, acumulado com a Administração Interna, depois da saída de Eduardo Cabrita.
  • Francisca van Dunem, Ministra da Justiça
23 Março 2022, 21h01

Francisca (Eugénia da Silva Dias) Van Dunem, natural de Luanda, onde nasceu a 5 de novembro de 1955 esteve seis anos nos governos da “geringonça” de António Costa. Começou e acabou com a pasta da Justiça – e, para o final, teve de acumular a da Administração Interna (deixada refém de um desastre chamado Eduardo Cabrita).

A magistrada sai quase diretamente para a reforma como juíza conselheira do Supremo Tribunal de Justiça, ostentando um percurso singular: tomou posse quando já estava no Governo e viu a sua saída desse tribunal aprovada (pelo Conselho Superior da Magistratura) quando ainda estava em funções governamentais. Reforma-se, portanto, a partir de umas funções que não conseguiu exercer.

O que pôde, isso sim, foi ouvir um elogio público recente do primeiro-ministro, o homem que não aceitou a sua demissão no auge da polémica que envolveu a nomeação do procurador europeu José Guerra. Se o momento mais divertido foi ouvir a ministra falar inglês no final de uma reunião internacional, a “questão José Guerra” não teve graça alguma. O Governo de Portugal preferiu designar o procurador mais bem classificado pelo Conselho Superior do Ministério Público (José Guerra) do que a procuradora Ana Carla Almeida, escolhida por um júri internacional – e pior foi que o tenha feito promovendo um currículo com erros.

Concretamente, o executivo tinha apresentado dados falsos sobre Guerra. Este não era nem “procurador-geral-adjunto” (apenas procurador), nem tinha tido uma participação “de liderança investigatória e acusatória” num processo sobre a UGT. Como então disse o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, foi “um desleixo lamentável”.

Francisca Van Dunem aceitou o pedido de demissão do então diretor-geral da Política de Justiça, Miguel Romão, mas António Costa não aceitou o seu.

A indicação deu que falar na Europa. O Parlamento Europeu criticou-a, em pelo menos duas oportunidades, e o Tribunal de Justiça da União Europeia teve mesmo de analisar um recurso de Ana Carla Almeida.

Tudo se passou durante a presidência portuguesa do Conselho da União Europeia e com um órgão criado para melhorar a cooperação entre os Estados-membros no combate aos crimes económico-financeiros que prejudicam a UE.

Combate à corrupção como ponto alto

O melhor momento de Francisca Van Dunem foi a aprovação da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção. Considerada insuficiente pela generalidade da sociedade e oposição política, ainda assim permitiu alguns avanços e fez com que a ministra escutasse os elogios do primeiro-ministro: “Seguramente não teria sido possível esta evolução, e a adoção desta estratégia de forma tão consistente, a execução rápida e coerente, se não tivéssemos beneficiado, no poder político, da experiência de uma magistrada de exceção”, disse, há pouco tempo, na comemoração do dia de combate à corrupção.

Outro dos dossiers mais mediatizados foi o da rendição da guarda na Procuradoria-geral da República. Muita gente em Portugal pediu a continuidade de Joana Marques Vidal, de quem Francisca havia sido subalterna, mas a ministra e o Governo tiveram o beneplácito do Presidente da República para fazer valer a tese dos mandatos longos, mas únicos, que fizeram apear a mulher que esteve à frente das maiores investigações da história da justiça nacional, como aquelas que fazem seguir para tribunal um ex-primeiro-ministro, José Sócrates, e um ex-banqueiro, Ricardo Salgado.

Licenciada pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, em 1977, Francisca Van Dunem é magistrada do Ministério Público desde 1979. Delegada do Procurador da República no Tribunal do Trabalho, no Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa e no Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa (DIAP), que dirigiu entre 2001 e 2007, desempenhou várias funções de destaque até assumir a pasta da Justiça.

Esteve no gabinete do Procurador-Geral da República entre 1999 e 2001 e, entre outros cargos, foi procuradora-geral distrital de Lisboa, de 2007 a 2015, ano em que suspendeu funções para tomar posse enquanto Ministra da Justiça do XXI Governo Constitucional.

Agora é tempo de Francisca Van Dunem, casada com o professor universitário Eduardo Paz Ferreira – um jurista sempre por dentro dos grandes negócios –, descansar antes do regresso a Luanda, cidade na qual nasceu e a onde quer, segundo disse numa entrevista recente, regressar.

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