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Fusões e aquisições prometem manter tendência de crescimento

“A economia portuguesa continua a demonstrar sinais de resiliência e perseverança”, diz Narciso Melo, head of Corporate Finance do Banco Finantia, ao Jornal Económico (JE).
5 Setembro 2021, 11h30

O termo que melhor define o estado de espírito dos protagonistas do sector da assessoria financeira é “otimismo”, porque o mercado recuperou francamente desde a travagem brusca provocada pelo início da pandemia de Covid-19, ultrapassando os níveis de anos anteriores, mesmo durante a mais profunda quebra económica vivida em democracia, e porque tem condições para continuar a crescer, prolongando a atual tendência.

“A economia portuguesa continua a demonstrar sinais de resiliência e perseverança”, diz Narciso Melo, head of Corporate Finance do Banco Finantia, ao Jornal Económico (JE), acrescentando que “o atual contexto de taxas de juro baixas e liquidez disponível tem gerado várias oportunidades ao nível de operações de M&A [fusões e aquisições, na sigla em inglês]”, o que permitiu o ressurgimento, desde o início do verão do ano passado, num movimento que continua até agora. “O ano de 2021 está a ser marcado por um otimismo cauteloso dos investidores, muito devido às expectativas de recuperação com a adoção generalizada das vacinas, o que tem permitido que o mercado de M&A e de assessoria financeira continue a experienciar um momento positivo, especialmente nos sectores menos afetados ou positivamente afetados pela pandemia, que deverão continuar a brilhar”, afirma Acácio Matoso Rego, head of Corporate Finance & Financial Sponsors – Corporate & Investment Banking do Santander em Portugal. “Com o avanço do programa de vacinação, a chegada da ‘bazuca’ europeia e o elevado nível de liquidez, perspetiva-se o acelerar das operações de M&A a nível geral e, também, em Portugal”, acrescenta.

O atual enquadramento macroeconómico, com taxas de juro a níveis historicamente baixos, suportou a retoma do mercado e os especialistas ouvidos pelo JE consideram que continuará a ser a base do esperado desenvolvimento futuro. “A economia portuguesa deverá seguir a tendência de recuperação nos próximos anos. Existe alguma expectativa sobre a evolução das taxas de juro, contudo, os receios de um aumento sustentável da inflação não têm sido concretizados. Espera-se, por isso, a manutenção dos níveis de taxas de juro de referência na Europa assim como nos spreads do risco soberano português”, diz Pedro Costa, Responsável pelo Departamento de Corporate Solutions Haitong.

O baixo preço do dinheiro permitirá explorar as oportunidades que se perfilam na ressaca da crise pandémica, que afetou de forma diferente sectores e empresas, e, também, suportar o investimento de adaptação para que as empresas se fortaleçam para aproveitar da melhor forma o processo de retoma das economias. “As oportunidades no desenvolvimento de processos de fusões e aquisições deverão dar-se pela implementação de decisões de investimento adiadas, fusões e operações de capitalização com vista a estabelecer empresas mais sustentáveis e competitivas para fazer face a novos choques e, ainda, por processos de reestruturação”, aponta Acácio Matoso Rego.
Narciso Melo refere concentrações empresariais, mas também a “atuação de fundos nacionais e internacionais que continuam pressionados para investir nos mais diversos sectores”. Pela escassez de capital em Portugal, Melo indicia que o investimento virá do exterior. “Relativamente a um futuro próximo, as nossas expectativas continuam bastante otimistas, com especial enfoque em operações cross-border”, diz. “A escassez endémica de capitais próprios em Portugal, assim como os reduzidos níveis de poupança, são fatores que explicam o motivo pelo qual as empresas e investidores nacionais deverão continuar mais do lado vendedor”, acrescenta, por seu lado, Pedro Costa.

Também Joaquim Castro, diretor do Bankinter Investment em Portugal, prevê “um número muito significativo de vendas das empresas portuguesas e poucas aquisições por parte destas”. Considera que as empresas portuguesas chegam, “na sua maioria, a esta etapa, tecnologicamente e comercialmente bem posicionadas, mas fracas em termos de capitalização”, constituindo, assim, um alvo para entidades externas.

 

Sectores em destaque
“Em Portugal, os financial sponsors internacionais deverão continuar a estar muito ativos e atentos ao mercado e perspetivamos que os empresários portugueses poderão estar agora mais recetivos a parcerias com este tipo de investidores, ou a operações de consolidação como forma alternativa de facilitar a capitalização e crescimento das suas empresas”, considera Acácio Matoso Rego. Dá como exemplo a entrada do fundo CVC, “um dos maiores financial sponsors mundiais” no capital da Sonae MC, dona da cadeia de hipermercados Continente, com a aquisição de uma participação de 24,99%, por 528 milhões de euros, acrescidos de um pagamento contingente diferido.

“A curto e médio-prazo, espera-se que os sectores menos cíclicos, bem como sectores que foram beneficiados com a pandemia de Covid-19, como por exemplo os sectores de tecnologia, retalho alimentar e saúde, liderem o dealflow”, diz o head of Corporate Finance & Financial Sponsors – Corporate & Investment Banking do Santander em Portugal. Concretiza, dizendo que, tendo em conta os estímulos à economia trazidos pelos Planos de Recuperação e Resiliência europeus e o levantamento gradual das restrições impostas pelo combate à pandemia, se manterá o interesse nas infraestruturas e energia & renováveis, que são “sectores mais regulados e com maior estabilidade de cash flows”, mas também em “sectores industriais de consumo ou serviços que foram positivamente impactados por esta crise, como os negócios de tecnologia, alimentares ou agrícolas, saúde, logística, materiais de construção, ou certos tipos de retalho, como a distribuição alimentar”.
“Adicionalmente, perspetivo que a atividade de M&A se mantenha em níveis relativamente elevados em 2021 e no próximo ano em transações de ativos distress nos sectores mais cíclicos e mais prejudicados pela crise pandémica, como o imobiliário, hotelaria e turismo, à medida que os níveis de valorização se tornem mais atrativos”, acrescenta.
Pedro Costa assinala, também, a possibilidade de operações internas no mercado. “Poderemos assistir a algumas operações de concentração em alguns sectores em Portugal com objetivos de ganhos de escala e de eficiência”, prevê.

 

Riscos na pandemia e nas taxas de juro
Mesmo com o otimismo declarado, existem riscos que são considerados, não só por possíveis reveses na gestão da pandemia, como por alterações ao quadro macroeconómico, com, por exemplo, o ressurgimento de pressões inflacionárias a condicionar a política acomodatícia seguida pelos bancos centrais.

“O grau de vacinação da população, as novas estirpes do vírus SARS-CoV-2, o aumento do preço da energia, a crise dos contentores, a rutura no fornecimento de matérias-primas e de subprodutos, o regresso da inflação, o fim das moratórias, o primado das políticas de ESG [sigla em inglês para ambiental, social e de governança], as reuniões por videoconferência, a inexistência de feiras internacionais, o teletrabalho, são algumas novas variáveis que os gestores têm de incorporar hoje nas suas decisões”, avisa Joaquim Castro. “Se algumas destas são meramente conjunturais, outras assumirão o carácter de um novo paradigma na sociedade e na economia”, considera, apontando, contudo, que “ambas geram um ambiente de incerteza, aumentando os riscos das decisões e também das indecisões, o que é limitador da atividade económica”.

Pedro Costa refere, ainda, como risco, uma eventual menor capacidade das empresas para cumprirem com o pagamento das suas dívidas. “A possível deterioração do risco de crédito não tem sido confirmada pelo downgrade das notações de crédito”, diz, mas considera que é “uma área a ter atenção, especialmente nos sectores mais afetados pela pandemia”.

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