Novamente, e num curtíssimo espaço de tempo, a justiça portuguesa voltou às manchetes dos jornais pelos piores motivos.

Todos estarão lembrados da nomeação do Juiz José Guerra como Procurador Europeu, num processo com “lapsos de curriculum”, com o Governo a assumir o erro grosseiro num comunicado enviado a Bruxelas, já lá vão dois anos doeste episódio que não nos dignificou na Europa. Isto a propósito do novo concurso europeu para o mesmo efeito, que até há 15 dias atrás, tinha em cima da mesa o nome do Juiz Ivo Rosa, com o Governo a ter intenção de o nomear, apesar de, no momento, a sua promoção a desembargador se encontrar suspensa por enfrentar dois processos disciplinares.

Ainda bem que o próprio desistiu da intenção e deu a possibilidade de o Conselho Superior de Magistratura (CSM) indicar vários nomes (5), que começaram esta semana a ser avaliados e ouvidos no Parlamento. É que o Procurador Europeu é uma figura muito importante, que tem responsabilidades de averiguação e acompanhamento dos processos dos fundos comunitários, do combate à fraude dos impostos intracomunitários, como o IVA, e da corrupção.

Não há muito tempo ocorreu a polémica que envolvia a distribuição de processos no âmbito de um esquema de corrupção, que originou a constituição do antigo presidente do Tribunal de Relação de Lisboa, Vaz das Neves, como arguido no processo Operação Lex.

Depois, veio a notícia de que o CSM decidiu, por unanimidade, instaurar processos disciplinares a três juízes desembargadores da Relação de Lisboa – Orlando Nascimento, Vaz das Neves e Rui Gonçalves – na sequência de uma auditoria aberta pelo Conselho para avaliar eventuais fraudes ou irregularidades.

Ainda nos insólitos, os magistrados apresentaram uma providencia cautelar no Supremo Tribunal de Justiça, para impedir a posse de Juízes-presidentes em várias comarcas do país, alegando falta de fundamentação na seleção dos candidatos, pondo assim em causa os processos que selecionam os principais rostos da justiça do nosso país – sendo os próprios juízes a fazê-lo.

E agora, mais recentemente, os desenvolvimentos da operação “Tutti Frutti”, onde, sem serem ouvidos, os políticos são “acusados” em praça pública, com suspeitas de há cinco anos atrás, sem (muitos) se conseguirem defender… Mas outras há, que apesar de indiciados, de recurso em recurso, vão esgotando os prazos na busca das prescrições de crimes.

São várias as evidências que estamos perante um problema que não é só da justiça, é também um problema político. Existe uma perceção generalizada da necessidade absoluta de valorizar e fortalecer a democracia em Portugal, sendo a justiça um pilar essencial neste processo. Os portugueses precisam de acreditar, verdadeiramente, que ninguém está acima da lei e que quem a viola é punido.

Os casos polémicos dos últimos tempos não descredibilizam só a justiça, mas também a democracia e Portugal. A simples existência de suspeitas ou de opacidade, na falta de transparência e sobretudo na dúvida do funcionamento das instituições democráticas, é uma doença perigosa, que envolve uma cura lenta e dolorosa.

O que todos temos de reclamar na forma como a justiça está a funcionar em Portugal, e para que casos como estes não existam nem se repitam, é uma necessária e urgente reforma na justiça, e o retirar de ilações e responsabilidade política de quem gere os destinos da justiça em Portugal.

Impõe-se recuperar a transparência, a verdade e a eficácia das instituições da nossa justiça, e isso não está nas mãos dos partidos, mas sim do primeiro-ministro e de um governo de maioria absoluta. A política ética tem algo a dizer, e não é pouco.