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“Governo tem de se apresentar como um facilitador da reabilitação em Portugal”, diz docente do ISEC Lisboa

José Manuel Mendes Delgado, assume que existe uma verdadeira onda e vontade de reabilitar atualmente em Portugal, mas que “a morosidade dos processos em fase de licenciamento, leva a que alguns dos proprietários adiem a sua intervenção ou acabem por vender”.
18 Abril 2022, 17h30

Reduzir as taxas e impostos, produzir uma legislação e regulamentos técnicos e de boas práticas adequadas à reabilitação e reaquilificação dos edifícios são algumas das propostas defendidas por José Manuel Mendes Delgado, para ao sector da reabilitação em Portugal.

No Dia Internacional dos Monumentos e Sítios, o docente do Instituto Superior de Educação e Ciências de Lisboa (ISEC) defende em entrevista ao Jornal Económico que o Governo tem de se apresentar como um facilitador da reabilitação em Portugal.

Para isso, o mestre em Engenharia Civil e especialista em provas públicas, assume que além do Executivo, também os municípios devem acionar sistemas eficazes e em tempo útil de incentivos fiscais e de isenções para a reabilitação de monumentos e edifícios antigos no país e que deve também ser aplicado ao preço da energia, petróleo e matérias-primas para fazer face aos constantes aumentos dos custos da construção.

Quais os principais desafios que a reabilitação e requalificação dos edifícios enfrentam atualmente em Portugal?

Não basta a vontade de reabilitar, não basta existirem fundos disponíveis e linhas de crédito acessíveis, é necessário muito mais e isso passa pela melhoria eficaz das condições de licenciamento, onde as respostas objetivas e claras e em tempo útil, são determinantes para tornar os investimentos atrativos, viáveis e com a qualidade que se impõe, onde o reforço sísmico, as novas tecnologias, os níveis de conforto, a eficiência energética, as acessibilidades e a necessidade de construir e de reabilitar com emissões de carbono zero, são temas que não podem ser descartados.

É necessário mudar, é imperativo a existência de “tempo para projetar”, projetar com qualidade, garantir revisão de projetos, onde o promotor, o dono de obra, tem de definir com rigor, quais os objetivos que pretende para o seu investimento, para a sua intervenção, ao nível de custos, de qualidade, de segurança e de ambiente, num sistema coerente e responsável, com profissionais e equipas multidisciplinares, competentes e experientes, onde o saber e saber fazer será o mote para o sucesso da intervenção de reabilitação.

O setor da reabilitação em Portugal, depara-se com grandes desafios para as empresas, para o Governo, que tem de se apresentar como um facilitador e um promotor do desenvolvimento, reduzindo taxas e impostos, produzindo legislação e regulamentos técnicos e de boas práticas adequadas ao setor, com envolvimento do LNEC, dos municípios, das ordens profissionais e de outras entidades, criando um sistema onde as regras e os instrumentos de gestão, sejam conhecidos e de fácil aplicação, onde todos saibam qual o seu papel, qual a sua função, as suas responsabilidades e limites de responsabilidades.

Que medidas deveriam ser implementadas para apoiar a reabilitação dos Monumentos em Portugal?

Compete ao governo, coordenar conjuntamente com os municípios, as associações empresariais, as ordens profissionais e demais intervenientes, a criação de um mecanismo que identifique o património monumental existente, suas características, o seu valor histórico, o seu estado de conservação, a sua importância para a região e as estimativas de custos e prazos, tendo em vista uma ação conjunta que viabilize o maior número de intervenções ao nível dos monumentos e em simultâneo, garantam um sistema equilibrado, coerente e de sucesso para todos os intervenientes.

É igualmente importante que o governo e os municípios acionem sistemas eficazes e em tempo útil de incentivos fiscais e de isenções, ao nível de taxas de licenciamento, de IRC, de IRS, de IVA, de IMI e IMT, para a reabilitação de monumentos e edifícios antigos, independentemente da sua localização, tendo em vista a criação de um sistema atrativo e de fácil acesso.

Refira-se ainda, a necessidade de criação de um sistema “Simplex para a Reabilitação” ao nível dos municípios, com a definição de regras, de prazos e de instrumentos claros e objetivos, em termos de projetos e documentos necessários para a obtenção de licenças. Criar uma linha verde, entre os municípios, a DGPC e as entidades que tutelem esta área, tendo em vista respostas eficazes e em tempo útil, que não sejam um obstáculo para o sucesso das propostas de reabilitação.

Considera que se olha pouco para este tipo de empreendimentos?

Nesta fase, existe uma verdadeira onda e vontade de reabilitar, quer pela procura de alojamentos resultado do aumento do turismo, quer pelos incentivos à reabilitação nos centros históricos e nas ARU, no entanto, a morosidade dos processos em fase de licenciamento, leva a que alguns dos proprietários adiem a sua intervenção ou acabem por vender.

A continua e até crescente procura de edifícios antigos e de fogos para reabilitar, necessita de ser acompanhada de um plano que crie condições para a implantação de uma matriz, que imponha maior fluidez nas operações de reabilitação, diminuindo os prazos desde a fase de projeto à fase de licenciamento, através de regras claras e objetivas, onde o proprietário, o investidor saiba ao que vai e que a sua intenção de reabilitação, não falhe por inoperância dos diversos intervenientes, em especial, nas respostas pouco claras e tardias por parte dos municípios, das concessionárias e das entidades financiadoras, que em muitas situações condenam ou adiam muitas das operações de reabilitação.

O setor da construção civil e em especial o da reabilitação, está na ordem do dia, mas é necessário que todos os agentes, contribuam com a sua parte e que os processos desde a fase de projeto até à fase de licenciamento e financiamento, decorram em prazos aceitáveis, criando uma nova dinâmica no setor e um mercado mais atrativo e aberto, um verdadeiro contributo para a criação de riqueza e para a criação de espaços, de cidades, onde seja bom viver e visitar.

O constante aumento dos preços dos materiais de construção são um entrave para a requalificação do património cultural de Portugal?

O tempo que medeia entre a fase de concurso, o contrato, a consignação e a fase de execução da obra, são hoje um fator preocupante para o mercado da construção, resultado da instabilidade dos preços dos materiais e dos equipamentos, que aliados à falta de stocks e às dificuldades de escoamento e da mobilidade a nível nacional e internacional, são de fato um entrave e uma dificuldade difícil de ultrapassar, face aos contratos e aos instrumentos de gestão das empreitadas, que preveem nem suportam tal flutuação de custos e de prazos de entrega.

Os empreiteiros, os fornecedores e os fabricantes, não conseguem manter preços a curto prazo, curto prazo onde a unidade é o dia, coisa nunca vista e onde todos os agentes, navegam no clima da incerteza e de vulnerabilidade absoluta, alavancados pelos custos descontrolados da matéria-prima, da energia e dos combustíveis, a dificuldade de estabilizar preços e de devolver ao setor a normalidade e a tranquilidade, num sistema de confiança, imprescindível para a produtividade e saúde do setor.

Em obras públicas, o CCP – Código da Contratação Publica, não está preparado para o aumento excecional dos preços de materiais e de equipamentos. A reposição do equilíbrio financeiro, as prorrogações de prazo, as revisões de preços, os trabalhos complementares, quer com origem em erros ou omissões ou em trabalhos não contratuais, não contemplam esta vil realidade de alteração de preços desde a fase de contrato até ao momento em que efetivamente os trabalhos são executados, onde na maioria das vezes, é necessário pagar adiantado e a pronto pagamento.

A falta de mão-de-obra tem sido colmatada com recursos humanos vindos de países estrangeiros, que apesar das dificuldades, têm sido a solução possível, uma solução morosa e que carece de formação intensa, face ao desconhecimento dos materiais, dos processos construtivos e das boas práticas, utilizadas em Portugal.

Compete aos governos e às instituições internacionais, criarem um sistema eficaz para estacaram o aumento do preço da energia, do petróleo e das matérias-primas, tendo em vista a produção necessária para satisfazer os diversos mercados e em especial, o mercado da construção civil e da reabilitação. Urge normalizar o setor, estabilizar os preços e minimizar as incertezas e riscos desnecessários.

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