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Hospital de Santa Maria diz que paragem cardiorrespiratória de grávida que morreu “não era de todo expectável”

Falta de médicos, fecho de urgências e vários casos que afetaram vidas humanas marcaram os últimos meses de Marta Temido à frente da pasta da Saúde, que apresentou a sua demissão às primeiras horas desta terça-feira.
30 Agosto 2022, 14h11

Os diretores de Serviço de Obstetrícia e de Neonatologia do Hospital de Santa Maria pronunciaram-se esta manhã sobre a morte de uma grávida durante uma transferência do Hospital de Santa Maria para o Hospital S. Francisco Xavier, por falta de vagas, numa conferência de imprensa na qual foi detalhado o seu acompanhamento desde que entrou nas urgências do hospital e a decisão que motivou a transferência.

Luísa Pinto, diretora do Serviço de Ginecologia e Obstetrícia, lamentou a situação, contextualizando a chegada da grávida ao Hospital de Santa Maria, antes de ser transferida “dada a estabilidade clínica [da grávida] e dado o benefício para o recém-nascido”.

“Constatou-se à entrada uma tensão arterial muito elevada. Foi imediatamente internada no bloco de partos, tomadas as medidas habitualmente tomadas na nossa primeira hipótese, que era pré-eclâmpsia”, detalhou, referindo que a mesma ficou estabilizada em poucas horas, tendo sido mantida sob vigilância “para ter a certeza de que estava tudo bem em termos maternos como fetais”.

A estabilidade da situação clínica justificou a decisão de se proceder à transferência de hospital, por falta de vaga naquele serviço e “pelo facto de estar mais do que cientificamente demonstrado que é preferível um recém-nascido nascer no local onde vai ser assistido do que ser transferido posteriormente”.

De acordo com a mesma responsável, a transferência foi decidida após a estabilização da grávida, que foi levada para o Hospital S. Francisco Xavier – que tinha uma vaga – acompanhada por um médico e duas enfermeiras no veículo.

Foi no decorrer do transporte para o outro hospital que, de acordo com Luísa Pinto, se verificou “algo que não era de todo expectável, dada a estabilidade clinica”. A grávida teve uma paragem cardiorrespiratória, tendo sido “imediatamente iniciadas as manobras de suporte básico de vida”.

“Infelizmente, quando a ambulância chegou ao hospital, a grávida ainda se mantinha em paragem, tendo sido realizada uma cesariana de emergência”, revelou, acrescentando que, apesar de o recém-nascido ter tido uma evolução favorável, “o desfecho materno foi fatal”.

Segundo a médica, a “grávida de 34 anos, na primeira gravidez, de 31 semanas, vinda do estrangeiro, não falava inglês nem português”, e a equipa não tinha acesso ao historial clínico da mulher, que entrou nas urgências com sensação de falta de ar e taquicardia (aumento da frequência cardíaca). A mulher tinha nacionalidade indiana e tinha chegado recentemente a Portugal, conforme revelou a “CNN”.

“Esta situação vem num momento de grande fragilidade para todos nós, no verão, em que muito se tem falado nas contingências. Queria sublinhar que, da parte da equipa de obstétrica, tínhamos uma equipa completa, mas esta situação [transferências] ocorre com frequência”, explicou.

A especialista sublinhou, na conferência de imprensa, que este tipo de transferências entre hospital acontecem frequentemente.

Por sua vez, André Graça, diretor de neonatologia do Hospital de Santa Maria, lamentou a “trágica” perda.

“A necessidade de transferências in utero, o que é a recomendação em todos os países do mundo, é evitar que os bebés nasçam num determinado local e que depois sejam transferidos de ambulância, apesar de existirem condições mínimas para o fazer, o melhor meio de transporte é sempre o útero da sua mãe, havendo condições de estabilidade para esse efeito, e foi exatamente o que se constatou nesta situação”, explicou o mesmo responsável.

“Noutras isso não é possível e mesmo não havendo vagas, como foi o caso nesta situação, o bebé poderia nascer e ser transferido a posteriori de ambulância, com riscos que são absolutamente significativos para um grande prematuro que é transferido de ambulância nas primeiras horas de vida. É uma situação que só se faz em último caso”, explicou.

“Semanalmente ou a cada duas semanas, temos picos de internamentos que nos impedem de dar resposta a todas as situações que nos aparecem. Temos quase diariamente de fazer esta gestão, e perceber quando é que há vaga para a mãe e para o bebé, conforme a situação e risco, e tentar encontrar, não podendo nos dar resposta por falar de vagas, o melhor local para esse bebé ser tratado. E isso é feito com uma grande frequência. Somos essenciais, somos recetores de situações de alto risco que não podem ser tratada noutras instituições que tem outro tipo de características”, disse ainda André Graça.

Falta de médicos, fecho de urgências e vários casos que afetaram vidas humanas marcaram os últimos meses de Marta Temido à frente da pasta da Saúde, que apresentou a sua demissão às primeiras horas desta terça-feira.

O chefe do Governo já aceitou o pedido de demissão de Marta Temido. Em comunicado, António Costa diz que “respeita a sua decisão e aceita o pedido”, que já comunicou ao Presidente da República.

 

 

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