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Inovação é essencial para indústria farmacêutica aproveitar oportunidades de crescimento

Os participantes no Fórum da Indústria Farmacêutica, promovido pelo JE, consideram que há oportunidades na reindustrialização da Europa e na reconfiguração de cadeias de abastecimento, mas o sector precisa de apostar na inovação e de um enquadramento favorável. A começar pelos ensaios clínicos.
10 Julho 2022, 11h00

A indústria farmacêutica portuguesa tem crescido a um ritmo mais acelerado do que o da generalidade da economia portuguesa, nos últimos anos, puxada pelas exportações, que mais do que duplicaram na última década.

Apesar disso, o sector ainda tem margem para crescer, se compararmos o peso que tem no produto interno (PIB) português com o rácio que se verifica noutros países europeus, e pode aproveitar as oportunidades que se colocam – e que todos reconhecem – com a aposta na reindustrialização da Europa e com a reconfiguração das cadeias de abastecimento, na sequência da pandemia de Covid-19. Para isso, terá se ser reforçada a aposta na inovação e alterado o enquadramento em que se desenvolve a atividade, para que as empresas possam ser mais competitivas e o sector consiga atrair investimento, de acordo com os participantes no Fórum da Indústria Farmacêutica, promovido pelo Jornal Económico (JE).

No quinquénio terminado em 2020, o volume de negócios da indústria farmacêutica portuguesa aumentou 41%, para quase 1,7 mil milhões de euros, enquanto o investimento cresceu 62% e as exportações 73%. Alargando a perspetiva para ó conjunto do sector da saúde, estamos em face de 5,9% do PIB, em 2020, segundo os dados do Health Cluster.

Sérgio Alves, country president da AstraZeneca Portugal, que participou no primeiro painel do Fórum, dedicado ao papel da indústria farmacêutica na economia, defendeu que a indústria farmacêutica tem a capacidade para ser um “motor para a inovação” na economia portuguesa, mas que, para isso, é necessário que esse papel seja reconhecido e tem de haver um enquadramento mais favorável. “Quando pensamos nas condições do acesso à investigação, fundamentais para garantir o investimento local de forma consistente e sustentada, Portugal está na cauda da Europa”, afirma. “Temos uma sensação de oportunidade perdida, [apesar da evolução registada]”, acrescenta Filipe Novais, diretor-geral da Astellas Farma, olhando para o que tem sido feito nesta área, mas acrescenta que acredita que o reforço de uma aposta na inovação terá repercussões profundas, sendo capaz de “levar atrás de si empresas pequenas, em desenvolvimento”. “Isso cria uma grande dinâmica”, assevera.

Os participantes na Fórum consideram que a capacidade do sector foi testada na resposta à pandemia de Covid-19, não só pela rapidez com que foram disponibilizadas soluções, mas igualmente pela capacidade de produção e abastecimento. “Podemos dizer de boca cheia que foi graças ao esforço da indústria [que a sociedade respondeu à pandemia]”, defende Guilherme Monteiro Ferreira, diretor de Acesso ao Mercado e Assuntos Externos da GSK, assinalando, no entanto, que “há uma memória relativamente curta daquilo que se passou”, por parte dos decisores. “Agora que mostrámos o nosso valor à sociedade, está na altura de avançar” para outro patamar nas questões de saúde, considera, apontando à necessidade de serem criadas condições para que as empresas possam aproveitar oportunidades e competirem internacionalmente.

Questionado sobre se o enquadramento existente em Portugal é propício ao desenvolvimento da investigação, Daniel Torres Gonçalves, sócio da sociedade de advogados PRA – Raposo, Sá Miranda & Associados e responsável pela unidade de economia da saúde, farmácia e biotecnologia, considera que “tem havido alterações legislativas que abrem oportunidades à indústria”, levando a um maior reconhecimento da “importância do sector”, mas cujos efeitos ainda carecem de verificação. “Vamos ver como vão funcionar na prática”, aponta.

Competição por ensaios clínicos
Um dos casos em que os estrangulamentos se destacam, nomeadamente regulamentares, burocráticos e relacionados com a capacidade do sistema entregar aquilo a que se compromete, é o dos ensaios clínicos, considerados fundamentais para o desenvolvimento da capacidade de inovação, mas, também, permitir o mais rápido acesso dos cidadãos a produtos inovadores. Nos estudos feitos sobre o potencial do sector, a valorização e profissionalização dos ensaios clínicos é sempre considerada essencial, mas não tem evoluído como as empresas desejariam.

Filipa Mota e Costa, diretora-geral da Janssen Portugal, que participou no painel do Fórum da Indústria Farmacêutica sobre a importância sobre a importância da inovação e desenvolvimento para o futuro do sector considera que Portugal poderia apostar na área dos ensaios clínicos, uma vez que possui a infraestrutura e talento para tal, mas que falta vontade política e, sobretudo, organização.

Atualmente, o objetivo declarado pelo Ministério da Saúde é de duplicar o número de ensaios clínicos em Portugal até ao final da legislatura e, na entrevista que deu ao JE, o secretário de Estado da Economia, publicada no Quem é Quem na Indústria Farmacêutica, acredita que “o crescimento e o desenvolvimento do sector farmacêutico trarão capacidade para Portugal elaborar mais ensaios clínicos”. No entanto, as empresas consideram que falta fazer muito, que o caminho está no início.

“Não temos que ambicionar ser referência. Estamos tão atrás, que qualquer coisa que fazemos é para melhorar, e isso já é bom”, diz Filipa Mota e Costa.

“Há muito talento em Portugal para estas áreas, emprego muito qualificado”, aponta, acrescentando que “[assim] haja demonstração de vontade política, haja liderança, temos aqui uma oportunidade enorme para o desenvolvimento do país”.

Para Mota e Costa, a questão essencial é falta de organização.

João Norte, Market Access & Corporate Affairs, da Bial, concorda com o apontado défice de organização do sistema em Portugal e acrescenta, ainda, que falta visão estratégica. Pede que se olhe para a inovação portuguesa exportada para o resto do mundo, defendendo que é assim que o país potencia emprego qualificado e a atração de investimento estrangeiro de qualidade. O objetivo deve ser “conseguir ter inovação feita em Portugal acessível aos doentes do mundo inteiro”, considera.

“Para atrair investimento internacional é preciso criar outras condições a que se junta depois a capacidade de entrada no mercado mais do que propriamente a fiscalidade”, diz, defendendo uma maior definição por parte do Governo sobre o que significa desenvolver o sector em Portugal. “O que vamos dar em troca às empresas? E o que vamos pedir para deixarem cá?”, questiona, suportando que é necessária uma “visão agregadora”.

“Temos muito caminho a fazer nesta área muito exigente”, finaliza.

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