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Joaquim Evangelista: “Futebolistas não estão conscientes das dificuldades após o fim da carreira”

O presidente do Sindicato de Jogadores de Futebol Profissionais falou ao Jornal Económico sobre os problemas que podem surgir no fim da carreira de um futebolista e sobre a atividade do sindicato nessa área, no seguimento dos artigos “E depois do Adeus? Tarantini quer mudar mentalidades” e “Deixar o futebol não é uma iniciativa do jogador”.
1 Fevereiro 2018, 07h05

“Os jogadores de futebol não estão preparados para terminar a carreira”. Esta é uma das conclusões que Ricardo Monteiro, mais conhecido por Tarantini, retira da sua experiência profissional no futebol e que – contou ao Jornal Económico – levou-o a criar o projeto “a minha causa”, uma iniciativa em que o atleta do Rio Ave pretende alertar para a necessidade de os jogadores profissionais se prepararem para uma vida pós-futebol.

No seguimento dos artigos “E depois do adeus? Tarantini quer mudar mentalidades” e “Deixar o futebol não é uma iniciativa do jogador”, que fazem parte de um conjunto de peças, publicadas esta semana, e que exploram a problemática suscitada por Tarantini, o Jornal Económico procurou saber se os órgãos que regulam e apoiam o futebol nacional têm interesse pelos jogadores profissionais, pensando também no fim das suas carreiras?

Contactada, a Liga Portuguesa de Futebol Profissional não mostrou disponibilidade em falar sobre a sua posição neste tema.

Já a Federação Portuguesa de Futebol revelou que atua, em parceria, com o Sindicato de Jogadores Profissionais de Futebol, no sentido de ajudar os jogadores em Portugal na ponta final das suas carreiras. O Jornal Económico apurou que ambos trabalham juntos em, pelo menos, três projetos: educação financeira, constituição de um fundo de pensões e um projeto de saúde mental, intervindo junto de jogadores profissionais e incluindo jovens em início de carreira.

Sobre o assunto, Joaquim Evangelista, presidente do SJPF, respondeu, por email, a um conjunto de questões sobre as iniciativas que o sindicato tem a pensar no fim de vida profissional de um atleta:

O SJPF tem algum programa junto dos clubes, ou junto dos jogadores de futebol para que os atletas em fim de carreira tenham algum apoio no fim das suas carreiras?
A Federação Portuguesa de Futebol lançou recentemente a Portugal Football School, a qual visa potenciar a formação dos diferentes agentes desportivos ligados à modalidade. Um dos públicos-alvo da Portugal Football School são os jogadores. Neste sentido, e dada a responsabilidade que o Sindicato dos Jogadores assume nesta matéria, quer junto da FPF quer dos seus sócios, bem como o reforço da sua intervenção através da constituição do Gabinete de Educação e Formação em 2016 e respetiva publicação do Programa de Educação e Formação, este eixo da Portugal Football School é operacionalizado pelo Sindicato dos jogadores. Desta forma, o Sindicato dos Jogadores procura promover as condições necessárias para que se desenvolva a carreira dual dos jogadores, isto é, de impulsionar a aquisição das competências e qualificações necessárias para afrontar o pós-carreira futebolística e assim aumentar as possibilidades de empregabilidade no futuro, dentro e fora do contexto desportivo.

Como são desenvolvidas as iniciativas do SJPF?
O Sindicato dos Jogadores tem intervindo a diferentes níveis: Primeiro, através de protocolo estabelecido com a Agência Nacional para a Qualificação e Ensino Profissional (ANQEP), derivação de jogadores no ativo e retirados para a conclusão do 12º ano de escolaridade. Atualmente, cerca de cinco jogadores já concluíram o 12º ano através desta parceria e cerca de 50 estão com o seu processo em desenvolvimento;

Segundo, através de protocolos estabelecidos com diferentes instituições de Ensino Superior, derivação de jogadores e ex-jogadores que pretendem realizar formação académica superior para instituições de Ensino Superior que os possam acolher e ‘tutorizar’, considerando as suas particularidades e disponibilidade temporal – atualmente, cerca de 20 jogadores estão a frequentar o Ensino Superior aproveitando os protocolos estabelecidos.

Terceiro, através da realização de formação não condizente de grau realizada em parceria entre o Sindicato dos Jogadores e diferentes instituições. Foram já realizados cerca de cinco cursos (e cerca de 100 jogadores participantes no total), particularmente vocacionados para a área da gestão e direção técnica na área do futebol.

Quarto, através da realização de formação própria, cuja única entidade formadora é o Sindicato dos Jogadores. Esta formação própria é levada a cabo no âmbito da vertente formativa do Estágio dos Jogadores (onde se fornecem conteúdos diversos relacionados com possíveis áreas de futura empregabilidade dos jogadores), ou em sede de clube, mediante solicitação junto do Sindicato para que seja realizada uma formação determinada, entre as diferentes áreas que o Sindicato coloca à disposição.

Complementarmente, o Sindicato dos Jogadores disponibiliza também uma bolsa de apoio económico para a realização de formação, a qual pode ser solicitada por qualquer jogador que pretende realizar formação qualificada e não tenha a necessária disponibilidade económica.

Que resultado já teve e que conclusão retira o SJPF dessas inicativas?
Em primeiro lugar, o impacto do Programa de Educação e Formação é tangível através do número de participantes nos diferentes níveis de formação e qualificação em que o Sindicato dos Jogadores intervém, o qual, em dois anos de atividade, é considerado positivo em termos absolutos (total de participantes) e suficiente em termos relativos (total de participantes em função do número de sócios).

Contudo, o contacto junto deste público-alvo permite aferir que os jogadores profissionais de futebol ainda não estão completamente conscientes da necessidade de formação nem das dificuldades, de diferente índole, que poderão passar após o término da carreira.

Num estudo levado a cabo pelo Sindicato dos Jogadores em 2016, é possível observar que apenas cerca de 50% dos jogadores da I e II Ligas estão na posse do 12º ano de escolaridade e 5% na posse de uma licenciatura, facto que revela que cerca de 45% dos jogadores não têm uma qualificação mínima para afrontar o mercado de trabalho e cuja necessidade não estão ainda totalmente sensibilizados. Neste sentido, o Sindicato dos Jogadores tem promovido a disseminação dos bons exemplos com os quais tem trabalhado, particularmente através daqueles jogadores que concluíram as suas etapas formativas no âmbito do Programa de Educação e Formação.

Junto dos mais jovens, o SJPF desenvolve também alguma atividade que alerte os jogadores ainda em formação para a importância de se precaverem para eventuais problemas no final das suas carreiras?
Por essência, o Sindicato dos Jogadores intervém junto dos jogadores profissionais. Contudo, no seguimento da perceção de que a falta de qualificação na idade adulta é uma consequência de uma abandono escolar prematuro, o sindicato tem procurado também intervir junto dos jogadores mais jovens ou em início de carreira.

São disso exemplo, diferentes formações levadas a cabo junto de atletas em academias dos principais clubes do país. Simultaneamente, o Sindicato dos Jogadores, com o apoio da Federação Portuguesa de Futebol, tem também ativos três projetos de suma importância com vista à preparação do pós-carreira: Primeiro, o projeto de educação financeira, que é desenvolvido em parceria com o Conselho Nacional de Supervisores Financeiros (constituído por Banco de Portugal, Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões e a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários), através do qual estão a ser desenvolvidas ações de formação sobre literacia financeira e diversos outros recursos pedagógicos para distribuição e usufruto dos jogadores;

Segundo, o Fundo de Pensões, iniciativa [criada em outubro e apresentada esta semana aos grupos parlamentares na Assembleia da República] que promove a possibilidade de os jogadores realizarem poupança durante a sua atividade como jogador profissional e cuja poupança poderá ser usufruída uma vez finda a sua carreira desportiva, não só nos termos convencionais mas em caso de lesão grave ou doença incapacitante e desemprego de longa duração;

Terceiro, o projeto de saúde mental, que é desenvolvido em parceria com a Sociedade Portuguesa de Psicologia do Desporto, através do qual estão a ser desenvolvidas também ações de formação junto dos jogadores, a ser produzidos e distribuídos recursos relacionados com a saúde mental do futebolista, assim como a criação de um canal de ajuda, que permite o acesso, por parte de jogadores no ativo ou em fase de transição, a acompanhamento psicoterapêutico especializado.

Não perca a entrevista a Tarantini, a última parte de uma série de quatro artigos sobre o fim da carreira do jogador de futebol em Portugal. 

http://www.jornaleconomico.pt/noticias/tarantini-o-fim-da-carreira-no-futebol-pode-deixar-marcas-negativas-e-traumaticas-263879

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