A campanha eleitoral continua marcada pelo desconhecimento do funcionamento do mercado financeiro. O aproveitamento feito em torno do medo dos portugueses, que passaram por traumas como os casos BES, PT, BPN, BPP, BANIF, para manipular votos, é muito preocupante.

Estão a ser  aplicadas expressões como “a bolsa é um jogo”, “arrisca-se a perder tudo”, “isso é um casino”, para defender uma ideologia do endividamento perpétuo. Ora, algumas árvores doentes não podem esconder a floresta saudável que é ter um mercado de capitais vibrante e activo.

Os gestores de fundos privados ou soberanos, que aplicam técnicas de gestão de risco, de diversificação geográfica, sectorial, cambial, entre outras, têm registado ganhos substanciais, muito superiores à inflação. É preciso é ter paciência e não focar apenas no que correu mal como justificação para defender nacionalizações.

Não admira que Portugal esteja em último lugar no ranking de literacia financeira, quando são os próprios responsáveis políticos a defender que a bolsa é um casino e não uma forma de financiamento alternativo das empresas e de aplicação de capitais por parte dos aforradores, para obterem um rendimento adicional.

A defesa da recompra das empresas privatizadas é o culminar da manipulação e da desinformação acerca do funcionamento da gestão de empresas na órbita do Estado e do absolutismo que representa.

Mais concretamente, a proposta consiste na recompra, não na nacionalização, de empresas como a EDP, CTT, ANA, REN, GALP, entre outras, com um custo estimado para os contribuintes superior a 30 mil milhões de euros. Esta medida iria custar anualmente, em juros, 600 milhões de euros, tendo em conta uma emissão de longo prazo a uma taxa de 2%, acrescendo o pagamento do valor aos credores. Os mais optimistas defendem que estas empresas dão lucro e dividendos.

É omitido o facto de durante os anos que permaneceram na órbita do Estado, algumas empresas apresentavam prejuízo, não eram geridas de forma eficiente, ficavam à mercê dos interesses de cada governo. Ou seja, eram geridas com uma visão de curto prazo e, principalmente, estavam sempre dependentes do accionista para poderem implementar os planos de investimento perdendo competitividade a nível internacional.

Como sabemos, os governos são peritos a anunciar investimentos para as próximas décadas, como em locomotivas, na ferrovia, em hospitais, ou aeroportos, mas na prática o que fazem é uma gestão do dinheiro através de cativações. Quando o próprio supervisor de mercado está dependente de autorização do governo para investir, fica explicado o futuro destas empresas.

É pura demagogia política e intelectual defender nacionalizações ou recompras sem explicar as suas consequências.

É necessário criar condições para fortalecer a supervisão dos mercados, das empresas, proteger os investidores, criar estruturas de incentivos onde os trabalhadores beneficiem dos resultados das empresas, combater a corrupção, as ligações entre Estado e empresas, e não fomentar a recompra de empresas que apenas nos tornam mais dependentes da dívida e reféns de interesses.

Portugal precisa de virar a página, não da austeridade ou do rigor orçamental, mas do bloqueio intelectual relativo ao capital.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.