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“O Brasil está a melhorar todos os índices, está a fazer o trabalho de casa em matéria de segurança e também está a apoiar a livre iniciativa”, defende presidente da Embratur

De passagem por Portugal, o presidente do Embratur apresenta uma renovada estratégia para o desenvolvimento do setor do Turismo no Brasil, na qual Portugal surge como país a reconquistar, no sentido de voltar a fazer crescer o fluxo de turistas portugueses.
28 Outubro 2019, 07h47

Numa altura em que cerca de 145 mil portugueses visitam o Brasil anualmente, quando chegaram a ser 300 mil não tem assim tanto tempo, Gilson Machado Neto, Presidente do Instituto Brasileiro do Turismo (Embratur) está de visita a Portugal para mostrar aos potenciais visitantes que o seu país tem mesmo de ser visitado.

Em entrevista ao Jornal Económico, o presidente da Embratur garante que apesar do fluxo de turistas estar em clara vantagem para nós, com o número de turistas brasileiros a aumentar significativamente nos últimos meses, esta relação “tem tudo para dar certo”. Para tal, o Brasil tem de conseguir fazer com que a mensagem certa chegue até aos portugueses: a segurança contra turistas está em números residuais e a oferta vai ajustar-se às preferências dos portugueses nomeadamente quanto à oferta de pacotes ‘tudo incluído’.

A bola está ainda do lado de um dos principais parceiros nesta relação de séculos: na TAP, a quem a Embratur, dando voz a muitos operadores, já fez sentir a premência de baixar os preços praticados. Com uma procura que em muito excede a oferta, não tem dúvidas de que um aumento da concorrência só trará vantagens para o turismo brasileiro.

Em termos de Turismo, e de uma forma geral, como avalia a atual relação entre Portugal e o Brasil?

O Brasil e Portugal têm desde sempre uma história muito peculiar. Portugal é a pátria mãe, é a nossa língua. Foi sempre um dos países que historicamente emitiu uma grande quantidade de turistas para o Brasil mas atualmente diminuiu. Por ano, chegámos a receber 300 mil turistas portugueses e hoje, infelizmente, recebemos apenas 145 mil portugueses. É um número muito baixo, sobretudo se comparando com o sentido inverso: viajam para Portugal mais de 1 milhão e 50 mil turistas brasileiros. É por isso que estamos aqui para divulgar o nosso país. O Brasil está a melhorar todos os índices, está a fazer o trabalho de casa em matéria de segurança e também está a apoiar a livre iniciativa. Temos até vários empresários portugueses a reinvestir no Brasil, como é o caso do grupo Vila Galé que tem agora três novos empreendimentos em fase de aprovação, no Nordeste. Estamos muito otimistas e acreditamos que a relação entre os dois países vai melhorar, sendo que o fluxo de brasileiros para Portugal vai continuar em alta, refletindo o facto de o Brasil estar finalmente a sair da crise e em plena recuperação económica, com os índices do emprego a melhorar e a inflação praticamente neutralizada. Cabe-nos então a tarefa de captar mais portugueses para o turismo brasileiro.

Quais são os mais recentes números quanto ao fluxo de turistas em ambos os sentidos? O que representa o mercado português no Turismo brasileiro?

No ranking de mercados emissores, Portugal ocupa o 11.º lugar, tanto nas receitas como na quantidade de turistas. Mas espero que recupere e que fique entre o 5.º e 6.º lugar que em tempos ocupou. Espero mesmo que venha a ser o primeiro na Europa porque hoje é o segundo, perdendo apenas para a Alemanha.

Não tenho dúvidas de que tudo vai melhorar porque Portugal pode constatar que o Brasil está a fazer a sua parte. O governo do Presidente Bolsonaro está a fazer o trabalho de casa e o melhor exemplo é o aumento do índice de segurança com o número de crimes a diminuir 25% nos primeiros seis meses deste ano. Isto significa que não foram assassinadas 7200 pessoas. E nas cidades turísticas, como Foz de Iguaçu, Porto de Galinhas, temos índices de segurança iguais aos de Portugal ou de outros países da Europa, como a Suíça. Os problemas surgem quando as pessoas saem das zonas turísticas e entram inadvertidamente em locais que não deveriam entrar. E isso acontece em qualquer local do mundo. Eu fui assaltado em Miami porque me perdi e acabei num bairro mais complicado.

No Brasil, quais são os destinos preferidos pelos portugueses?

O turista português gosta muito do Nordeste brasileiro, das praias. E por isso escolhe sítios como Porto de Galinhas, Natal, Pipa, Salvador. Mas também gosta muito do Rio de Janeiro, São Paulo e agora junta-se Brasília, para onde existe, há já algum tempo, um voo da TAP direto e que, cada vez mais, se tem vindo a afirmar como um destino de ecoturismo e de gastronomia.

Que papel tem assumido a TAP na relação entre os dois países?

A TAP é uma das companhias mais importantes de ligação entre o Brasil e a Europa. Entre a Europa e o Nordeste brasileiro é mesmo a companhia com maior peso. É a companhia com mais voos para os europeus e Portugal acaba por funcionar como uma porta para o Brasil, sobretudo para o Nordeste. Mas temos o problema: os têm de baixar, os bilhetes estão mesmo muito caros. Isto é fruto da TAP estar praticamente sozinha no mercado e, apesar dos bilhetes estarem caros, a procura existe e os voos estão lotados com muitos mais brasileiros do que europeus, em voos de ida e volta. Com o Brasil a recuperar economicamente, a tendência é haver muito mais procura do que oferta e, infelizmente, já faltam aviões. O mercado vive hoje uma crise, mas uma ‘crise boa’, já que não falta procura, há até excesso, mas há pouca oferta de voos. A Embratur está sempre a trabalhar nestas questões e já tivemos várias reuniões com a TAP. Vamos também reunir com o CEO da Euroatlantic porque estamos constantemente a estudar possibilidades de novos voos entre Portugal e o Brasil, através de outras companhias.

Aquilo que vários operadores portugueses nos dizem é que se fosse possível baixar o preço das tarifas, conseguiriam duplicar as vendas porque existe uma procura natural. O Brasil é um destino muito desejado pelos portugueses. Outro dos pontos que referem é que tentemos sensibilizar a hotelaria para aumentar a oferta de pacotes ‘tudo incluído’ porque os portugueses procuram muito este tipo de oferta. Por tudo isto, vamos falar com a associação brasileira da indústria hoteleira, bem como com todos os players para que percebam que estão a perder muito dinheiro e que não estão a conseguir responder a esta grande procura. Se conseguirmos ter mais aviões e mais concorrência, os preços vão baixar e o número de turistas vai rapidamente duplicar. Os operadores pedem-nos apoio para que se consiga que os voos charters entrem neste cenário.

 

O Governo brasileiro apresenta o turismo como uma das suas prioridades. Em que se traduz esta estratégia?

Pela primeira vez, na história do nosso país, temos um Presidente que conhece o real protagonismo que o Turismo tem na recuperação económica do Brasil. Ele aposta no Turismo porque sabe que pode ser tão, ou mais, importante que o agronegócio. O Turismo é a maneira mais rápida de chegar à recuperação económica. No agronegócio, temos de plantar, esperar que venha a chuva, esperar mais seis meses, no mínimo, para colher, vender e ainda esperar para receber. No Turismo, não. Já temos tudo pronto: a cadeia hoteleira tem apenas uma taxa de ocupação de 45%; temos um parque aeronáutico e aeroportos perfeitos, com pistas para grandes aeronaves, com terminais completos; e todas as grandes cidades do Brasil têm estradas boas. Temos mesmo tudo, falta divulgação e dar segurança ao turista. E a primeira coisa que tem de acontecer é o brasileiro começar a falar bem do Brasil. Não importa investir milhões de dólares em divulgação se o próprio brasileiro fala mal do Brasil quando viaja. E são nove milhões de brasileiros a viajar pelo mundo. É esta mentalidade que está a mudar, e o exemplo foi dado pelo Presidente ao falar sobre Turismo, recentemente, na ONU. Foi a primeira vez que um presidente brasileiro o fez.

Também nós, na Embratur, estamos a mudar o foco. Deixamos para trás as apostas na ‘caipirinha, tanga e favela’. Não é que não sejam atrativos importantes mas, passados dez anos, percebemos que não resultou. Os números mostram que o turismo internacional não passam dos seis milhões de visitantes, estagnaram, mesmo tendo acontecido a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos. O Brasil, em 1966, tinha 90 milhões de habitantes, o mundo emitia 400 milhões de turistas e o Brasil recebia 3,8 milhões de turistas. Hoje, o Brasil tem 210 milhões de habitantes, o mundo emite 1,4 mil milhões de turistas e recebemos só seis milhões. Se tivéssemos mantido o ritmo inicial de crescimento hoje teríamos entre 12 a 13 milhões de turistas. É por isso que temos um projeto ambicioso para mudar esta realidade. Primeiro, e já está a ser posto em prática, estamos a autorizar vistos para americanos, canadianos, japonês e australiano. O que já originou um aumento de 230% nos vistos concedidos a estes países, desde 17 de junho último. E já há mais 21 voos entre o Canadá e o Brasil. Outro plano ambicioso é a isenção de vistos para chineses, e para os chamados Tigres Asiáticos, como o Vietname, a Indonésia, e ainda para a Índia. Queremos ainda a isenção de qualquer barreira dentro do MERCOSUL. Como na Europa, tem de existir uma política de céus e estradas abertas para o turista dentro deste espaço. Nesta luta, estão também os governos da Argentina, Paraguai e Uruguai.

Outro potencial é a nossa vocação natural para o Turismo Aeronáutico. Temos oito mil quilómetros de costa, a nossa Amazónia é azul com mais de 800 ilhas de águas quentes, o ano todo. Também poderíamos ser líderes no segmento dos cruzeiros. Não o somos devido à nossa legislação laboral, porque estas empresas optam por destinos onde têm segurança jurídica. Lutamos, pelo menos, por uma equiparação internacional para que a legislação sobre os navios de cruzeiro tenha aplicação no mundo todo. O resultado é que só temos seis navios a circular e um movimento anual de cerca de 300 mil passageiros. Mas chegámos a ter 800 mil.

Destaco ainda a recente aprovação do Presidente do primeiro porto flutuante para cruzeiros que vai localizar-se perto de Florianópolis.

Ainda nesta área, queremos fazer com que o Brasil seja o número um em mergulho de contemplação e em pesca desportiva. Para tal, estamos a afundar mais de 1200 recifes artificiais, de navios a tanques de guerra e até aviões. Para que o mergulhador tenha o que ver, fotografe e se divirta. E o mergulhador é um turista que passa muitos dias no local, porque tem de chegar dois dias antes e sair dois dias depois devido à pressurização.

Estamos de facto a investir forte no ecoturismo porque enquanto o turismo está acrescer entre 3,5% a 4% no mundo, o ecoturismo está a crescer 12% a 13%. E nós temos recursos naturais que poucos países têm.

A estratégia passa ainda pela abertura ao investimento estrangeiro, com o foco na redução da burocracia. Somos procurados por muitos grupos que querem abrir resorts e para estes casos estamos a trabalhar nas autorizações para abrirem casinos. E não precisamos de inventar um novo modelo de negócio, basta copiar o bem-sucedido modelo de Macau. Será o empresário a dizer onde se quer instalar, não seremos nós a indicar, porque ele é que sabe onde quer investir o seu dinheiro. Estes projetos não terão dinheiro público, a nós, caberá apenas facilitar e fiscalizar, ter uma boa e transparente política de ‘compliance’.

Outra aposta grande aposta são os parques temáticos, como a Disney ou a Universal. Uma construção livre de impostos, durante um certo período, para que o empresário recupere o investimento e consiga criar o máximo de postos de trabalho (hoje três milhões de desempregados). A localização está por definir mas deverá ser na zona do Rio de Janeiro ou de São Paulo, devido à rede aérea existente.

As recentes polémicas com a insegurança, a instabilidade política ou os incêndios na Amazónia, refletiram-se negativamente no Turismo?

A questão da Amazónia nasceu de uma ‘fake news’ criada e orquestrada pelos grandes media internacionais e brasileiros e por Emanuel Macron, Presidente de França. O efeito devastador das ‘fake news’ começou no dia em que o Presidente fez um post nas redes sociais em que se refere ao Brasil como sendo a sua casa, casa essa que estava a arder. Mas nesse post, usou uma foto de 1989 que nem sequer é no Brasil mas sim na Índia, e pertence a um fotógrafo que morreu em maio de 2003. Rapidamente várias celebridades, como a Madonna e o Cristiano Ronaldo, começaram a comentar esta mentira e propagou-se. Na verdade, este ano foi até o ano em que ocorreram menos fogos na Amazónia. A Amazónia não arde, porque um copo de água não pega fogo, é húmida e é mata verde. Quem conhece, no local, sabe que não pode acontecer. O que ardeu, e arde todos os anos, é uma região ao redor, chamada de cerrado brasileiro ou Amazónia legal (nome que vem do facto de ser uma área com financiamentos públicos). E de forma espontânea e natural ocorrem alguns fogos. Baste ver que nem houve registo de mortos, o que, com aquela dimensão, teria mesmo de ter acontecido, tal como foi em Portugal ou na Califórnia. Mas com estes limões, nós fizemos limonada. E já muitos órgãos de comunicação nos deram a oportunidade de nos defender, mostrar a verdade e provar.

Sobre a segurança, friso que não existe estatística no Brasil de violência contra turista. Os números são irrelevantes. Mas os media brasileiros continuam a gostar de vender esta ideia errada. Os registos do ano passado, em sítios muito procurados como Maceió, não ocorreram assassinatos e em Porto de Galinhas registaram-se dois casos mas entre traficantes. E quando acontece alguma violência contra os turistas todos se juntam para repudiar, desde o Governo, ao poder local e até os ‘reis do crime’ organizado.

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