Em 2003 estreou um filme com Jack Nicholson e Diane Keaton, intitulado “Something’s Gotta Give”. Ou, em português, Algo tem de ceder. Há poucos dias, a expressão foi usada por Kristalina Georgieva, A diretora-geral do Fundo Monetário Internacional, ao jornal “Politico”. Disse ela que “É simplesmente impossível que as taxas de juro subam tanto depois de terem sido tão baixas durante tanto tempo e isso não causar vulnerabilidades. Algo vai explodir”.

Ora não é preciso propriamente ter dons de vidência para perceber o que vai então explodir. Será, obviamente, a classe média. Uns percebem, outros não. No Canadá, a ministra das Finanças Chrystia Freeland, citou um relatório segundo o qual “Vários sentiram que muito poderia ser feito para tornar a habitação mais acessível, com muitos comentando que, mesmo para aqueles que ganham salários de classe média, os custos para comprar uma casa ou arrendar estão a tornar-se cada vez mais caros”.

Evidentemente, o custo do crédito, o aumento dos alimentos, a inflação em geral associada ao aumento das prestações ao banco, empurra silenciosamente para o abismo aqueça pouca classe média que ainda teimava em existir. Os advogados, médicos, professores, arquitetos, profissionais liberais, vão progressivamente comprovando nas suas faturas o arrumo que está a suceder, colocando cada vez mais a classe média na prateleira dos destituídos.

Para termos uma ideia, de acordo com o Banco Mundial, as pessoas de classe média são aquelas que despendem diariamente entre 7,75 e 38 dólares. Como se perceberá desde logo, é evidente que a amplitude financeira aqui considerada é muito lata. Mas também é significativo que o valor máximo considerado não seja, mesmo assim, suficiente para suportar os encargos, repartidos ao longo do calendário.

Ou seja, se o cidadão de classe média somar a renda da casa ou prestação, às faturas de luz, gás e água, mais as comunicações estaremos sempre num valor de despesa que é muito superior aos 38 dólares considerados. Já em outubro do ano passado, a “Deutsche Welle” noticiava que a classe média há muito representa uma promessa de avanço social na Alemanha, mas os bons tempos parecem ter acabado.

Isso é particularmente verdadeiro para os jovens, para quem está a tornar-se cada vez mais difícil garantir um lugar na classe média, de acordo com um estudo conjunto da OCDE e da Fundação Bertelsmann. Segundo o estudo, a hipótese de pertencer ao grupo de rendimento médio é 10 pontos percentuais menor do que em meados da década de 1990.

A classe média em geral, e a portuguesa em particular, tem assim pela frente um dilema: como adequar a despesa que aumenta significativamente a uma receita que se mantém ou diminui? Não será difícil ver o caminho. Ele passa pela redução da carga fiscal. Sem isso, estaremos apenas a continuar a garrotar uma classe média já exangue.

 

 

Os meus parabéns a Armindo Monteiro, o novo presidente da CIP que substitui António Saraiva. Desejo-lhe votos de sucesso para os desafios que tem pela frente, a começar pelas alterações aprovadas à Lei laboral. E a António Saraiva envio um obrigado pelo desempenho do cargo exercido até aqui, com enorme competência e serviço cívico.