Conhecidos os resultados das eleições, importa agora olhar para o futuro do país e para as grandes reformas necessárias para melhorar a vida das pessoas nos próximos anos.

Um dos temas mais relevantes para a vida dos Portugueses é, sem dúvida, o da habitação. A habitação tem impacto na política de cidades, na composição demográfica, na política de juventude, na própria mobilidade e competitividade do país.

Dados recentes divulgados pelo INE mostram uma subida do preço das casas, no último trimestre de 2021, de 12%. E esta subida não é apenas motivada pela compra de casa por estrangeiros, estando aliás os portugueses em maioria entre os compradores.

O panorama da habitação em Portugal, sobretudo em cidades como Lisboa e Porto, mudou radicalmente nos últimos anos.

Verificou-se uma gentrificação do centro das cidades para as periferias, num primeiro momento por falta de oferta e pela degradação das habitações no centro e, depois, por políticas como a dos vistos gold e do alojamento local, que levaram à gentrificação forçada pelo aumento do preço das casas nas zonas centrais.

O centro das cidades ficou, assim, mais dinâmico e povoado – não necessariamente habitado – em face destas alterações. O turismo cresceu e, com ele, a restauração e a indústria do lazer. Ainda assim, os portugueses queixam-se, e em particular os jovens, da incapacidade de aquisição de habitação própria no centro da cidade, para onde gostariam agora de regressar, tendo em conta o seu dinamismo.

O panorama não é muito distinto no que toca ao mercado de arrendamento. De um mercado praticamente inexistente antes de 2013/2014, por força da falta de oferta e da rigidez do mecanismo de formação de rendas, passou-se para um cenário de grande volatilidade e aumento de preços. A reabilitação urbana provocada pelos vistos gold trouxe muitas casas para o mercado de arredamento. Contudo, o crescimento do alojamento local por força do aumento do turismo tornou o mercado do arrendamento de longa duração bem menos apetecível e os seus preços incomportáveis.

A pandemia trouxe alguma acalmia a esta realidade pela redução do turismo, mas os dados mostram, como se vê, um aumento do preço das casas, mesmo durante o período pandémico, o que leva muitos a falar da existência de uma bolha imobiliária.

A Constituição garante a todos o direito à habitação, no seu artigo 65º. Trata-se de um direito social, sob reserva do possível, que depende, em larga medida, das opções políticas de cada momento.

Cabe assim ao Estado desenvolver políticas que garantam este direito, mas deve fazê-lo no contexto e tendo em conta outras políticas e interesses de desenvolvimento coletivo.

Para este efeito aprovaram-se programas de habitação jovem e, mais recentemente, a cidade de Lisboa aprovou mecanismos de disponibilização de habitação a jovens e limitou o alojamento local em determinadas zonas da cidade. Desde o início deste ano, os vistos gold não podem corresponder ao investimento em habitação em cidades como Lisboa e Porto, devendo dirigir-se para o interior do país.

Numa altura em que se discute o futuro de Portugal na próxima década, o destino dos fundos europeus e as grandes reformas, seria importante discutir o futuro da habitação, evitando-se medidas casuísticas que visam reagir ao imediato.

Destas medidas depende uma parte relevante do investimento estrangeiro que Portugal recebeu nos últimos anos, a reabilitação urbana e a atratividade das suas cidades, mas também a capacidade de atrair jovens para os centros urbanos, talento internacional e a mobilidade. Sem esquecer o interior do país que, num mundo digital pode atrair, pela sua qualidade de vida, os chamados nómadas digitais, portugueses ou estrangeiros, que podem hoje trabalhar a partir de qualquer parte.

O nosso futuro coletivo depende também do cumprimento que soubermos dar ao direito à habitação.