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O Homem Mais Inteligente!

Marcelo, espero, terá a frieza dos sábios, engolindo o sapo da humilhação, mas deixando que este governo-morto se mumifique, permitindo que a CPI  seja um “abre-te sésamo” na gruta fundo das moedas de oiro da TAP, e que implique e desmascare os 40 parceiros de um qualquer Ali Babá de trazer por casa. Este governo dificilmente chega a Agosto na sua plenitude de funções. Mas não deve ter indulto.
5 Maio 2023, 07h15

Hoje vou arriscar que este texto esteja completamente desatualizado, à hora em que o paciente leitor se entediar a interpretar estas linhas.

Marcelo falou ontem às 20h00, isto se nenhum meteorito político, institucional, ou de “egotrip”, não tiver embatido contra o Portugal governativo.

O país encontra-se, às 16h00 desta quinta-feira, quando escrevo este arrazoado, suspenso acerca da manutenção do Governo, e/ou da maioria parlamentar, resultado da rotura entre os dois grandes protagonistas da última década. Costa e Marcelo celebraram a verdadeira geringonça, coligando-se no seu próprio interesse para se manterem naqueles que, pragmaticamente, são os dois mais importantes cargos da República (o presidente da Assembleia da República, sejamos claro, é normalmente decorativo, tendo Santos Silva tido o condão de tornar a sua figura regimental como vagamente circense).

Como escrevi em tempos, esse “braço-dado” já terá levado a combinações indecorosas, entre dois atores sempre mais preocupados na gestão das suas carreiras politicas, do que propriamente no interesse nacional.

Tenho como certo que, face à catástrofe que tem-se constituído o XIII Governo Constitucional, Costa e Marcelo acertaram uma saída airosa para ambos: Marcelo não convocaria eleições antes do resultado da Europeias, e se o PS as perdesse, a Assembleia da República (AR) seria dissolvida, mesmo a tempo de Costa partir para Bruxelas, sucedendo a Charles Michel no cargo de presidente do Conselho Europeu, cuja indicação caberá aos socialistas europeus caso fiquem, como se espera, com o segundo maior grupo no parlamento europeu (numa situação de vitória, indicarão para a comissão europeia o espanhol Pedro Sanchez). Esta “Tordesilhas” do século XXI tinha o condão de evitar que Marcelo se submetesse, na sua ótica muito particular, a nova “desautorização” pelas urnas, já que este considera que uma dissolução antecipada da Assembleia deve significar um derrota da maioria, e permitiria a Costa transferir-se para o El Dourado Europeu, sem aquele ónus incómodo, que ainda hoje acompanha Durão Barroso, de que fugiria para Bruxelas, pois nessa altura já não será 1º Ministro.

A realidade, como acontece tantas vezes, impôs-se, trocando as voltas ao Kronos destes tubarões de águas profundas. A sucessão de incidentes graves, que atiram as “trapalhadas de Santana” para o altar da ingenuidade governativa, associada à via sacra da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da TAP, que promete arrastar-se e degradar a imagem do aparelho Costista para níveis inimagináveis, obrigaram um Marcelo, ansioso por umas eleições europeias que amparassem a sua decisão, já irrevogável (pois…), de encurtar este mandato antes de perder poderes institucionais para tal, a avisar que poderia não sustentar o governo até ao próximo ano. Costa veio logo avisar que, se isso acontecesse, iria (re)candidatar-se, pretendendo que o Presidente da República (PR) ficasse inseguro relativamente ao resultado eleitoral.

O caso das notas de Frederico Pinheiro, ex-adjunto de Galamba, veio criar um terramoto na lógica perversa dos tacticistas do regime. O caso é demasiado grave.

Pinheiro terá percebido que seria cozido sozinho na chama ardente na CPI, tendo sugerido a Galamba o envio das notas que confirmavam as perguntas combinadas, desprezadas pelo Ministério das Infraestruturas, alegadamente, por serem “informais”. Mas, que diabo!? Alguma vez um “combinanço” deste jaez poderia ter carácter formal? O que ficaria a faltar? Por absurdo, e mal comparado, luvas de um saco azul de uma qualquer autarquia firmadas em folha de 25 linhas e selo branco?! Tenham dó!

Obviamente que Pinheiro foi, ingenuamente acrescente-se, buscar o “seu” computador pois tinha receio que a formatação e/ou manipulação do seu conteúdo os deixassem como responsável único pela perversão do inquérito à então CEO da TAP. Aquele momento clássico de que a culpa é do mordomo, ou do motorista, como na atualização socrática da rábula. O episódio das agressões, de ter ficado preso dentro do edifício, do recurso ao SIS por parte de Galamba, da transmissão em comunicado por parte do ministério do que se tinha passado naquela noite, tentando antecipar a sua versão à que, inevitavelmente, Pinheiro iria veicular, veio revelar a saciedade, a total incapacidade do “João amigo de Sócrates” em gerir um rancho folclórico, quanto mais um organismo governativo. Veio também penosamente confirmar, inclusive com dor, que as ministras políticas deste governo, Mariana Vieira da Silva, calada e muda, e Ana Catarina Mendes, desautorizada hora-sim, hora-não, não têm qualquer peso político neste, ou em qualquer outro, governo, por total falta de vocação para o cargo.

A terceira versão da governação Costa, naturalmente já não existe, tenha ou não Marcelo a demitido, tenha ou não dissolvido a AR.

É aí que Costa decide tirar o joker do bolso esquerdo, combinando aquela inenarrável rábula do “demito-me, não te demites nada”, que vem desafiar, como nunca, Marcelo.

As coisas estão más para o governo, mas só podem piorar. Costa pica, com ferros longos e duros, um Marcelo ferido, esperando que a adrenalina do professor o leve a partir a loiça, dando involuntariamente uma última oportunidade a Costa. Seria o adeus á CPI da TAP, permitindo a Costa apresentar-se o mais fresco possível, argumentar que sobrevoou as trapalhadas sem que fosse parte destas.

Marcelo, espero, terá a frieza dos sábios, engolindo o sapo da humilhação, mas deixando que este governo-morto se mumifique, permitindo que a CPI  seja um “abre-te sésamo” na gruta fundo das moedas de oiro da TAP, e que implique e desmascare os 40 parceiros de um qualquer Ali Babá de trazer por casa. Este governo dificilmente chega a Agosto na sua plenitude de funções. Mas não deve ter indulto.

Marcelo, “noutra vida”, minha e dele, a propósito doutra situação marcante da nossa vida pública, disse-me profeticamente que “o problema do homem inteligente é esquecer-se que há sempre alguém mais inteligente que o pode querer destruir”.

Espero que faça jus da fama de ser o homem mais inteligente.

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