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O Moribundo, o Hegemónico e as Sondagens

Aqui chegados, o CDS é um partido (ainda) de quadros mas sem eleitores. Ao contrário do Chega, que tem eleitores de sobra, mas (quase) sem quadros.
7 Fevereiro 2022, 07h15

O CDS, não obstante ter tido mais votos que PAN e Livre, no contexto nacional, não conseguiu eleger representação parlamentar, ao contrário daqueles dois partidos. A sua presença e dispersão pelo país, não obstante se encontrar em plano inclinado, prejudica o histórico partido fundador da democracia. Não tanto pelo muito discutido, por estes dias, método de Hondt, mas pela inevitável existência de círculos distritais/regionais. Perante a votação que tiveram, estes três partidos só poderiam eleger um mandato no maior dos círculos. Lisboa. E foi exatamente aí que PAN e Livre, este destacado à frente, tiveram mais votos que o CDS. O Livre, que provou ser um fenómeno trendy essencialmente da capital, onde recolheu quase metade dos seus votos, ainda que tivesse merecido a confiança de menos 20 mil portugueses, comparativamente com os Centristas. Como diria Guterres, “é a vida”. Dito de outra forma, são as regras do jogo democrático. E o CDS de Francisco Rodrigues dos Santos, Ribeiro e Castro e Martim Borges de Freitas, manifestamente não o soube jogar. Em primeiro lugar, e perante a evidência de que PSD não estaria disposto a uma coligação do tipo “AD”. Depois, não apostando nos círculos, e em discursos para os respetivos eleitorados, onde teria alguma hipótese de eleger.

Rodrigues dos Santos (estou a evitar ao máximo chamar-lhe Chicão, porque o jovem político tem direito à mesma dignidade institucional que os seus demais contendores) tentou resgatar algumas das bandeiras que renderam no passado, nomeadamente no “Portismo”, grandes votações ao Partido Popular. Mas, para mal dos seus pecados, escolheu os temas errados. O resgate do “partido da lavoura” poderia ter eficácia, não fosse o mundo rural e a agricultura, vagamente indiferentes para o cidadão de Rio de Mouro, Sacavém ou da Parede. A única ligação destes às causas verdes, mas também dos eleitores do Príncipe Real ou das avenidas novas, é a narrativa demagógica e radical dos proto-ecológicos PAN ou Livre, curiosamente odiados no interior do país. Onde “elas moem a sério”. Onde vive, realmente, o “mundo verde” português.

Não custa lembrar que o CDS foi, nesses processo cíclico onde Portas ia desenterrar os temas caros à direita conservadora, o partido da segurança pública, com discurso de agrado às forças de segurança, “cauteloso” (no sentido mais protecionista do termo) relativamente às quotas da imigração, não esquecendo o eterno “partido dos contribuintes”, sempre crítico face aos critérios de atribuição e fiscalização do Rendimento Social de Inserção (RSI). E esses sim, são temas caros à malha urbana e suburbana.

Claro está que o leitor já se lembrou que essas são também as temáticas prioritárias de Ventura e do Chega, verberadas com um maior radicalismo, mas dentro da mesma linha com que Portas, e mesmo Manuel Monteiro antes de si, navegava.

E era precisamente pelo facto do CDS empunhar essas bandeiras, que nunca antes um partido de uma linha tão dura como a de Ventura tinha conseguido sucesso popular e eleitoral. Um pouco como Chirac ou Sarkozy em França, que tinham uma dureza de palavras em público, e em campanha, que felizmente não acompanhava eco na sua governação, muito mais branda e europeísta. Mas que servia para travar o avanço da Frente Nacional dos Le Pen.

Aqui chegados, o CDS é um partido (ainda) de quadros mas sem eleitores. Ao contrário do Chega, que tem eleitores de sobra, mas (quase) sem quadros.

É penoso, que um partido de conservadorismo moderado, parceiro preferencial e “seguro” do PSD, deixe de ter assento na Assembleia da República. Ainda mais quando teve mais de 85 mil votos. Ao Livre, há quatro anos, bastaram uns modestos 55 mil para premiar Joacine. Não se deve legislar a quente, mas é mesmo de meditar sobre um círculo de compensação.

Partido Preferencial

Esta legislatura é invulgarmente longa, terminando em Outubro de 2026. Quando lá chegarmos o PS terá governado o país durante 24 dos últimos 31 anos, ou seja, desde que Cavaco Silva deixou a liderança do executivo, em Outubro de 1995. Ter-nos-emos transformado, inequivocamente, num sistema de partido preferencial ou hegemónico. O conceito não é novo, nem se aplica apenas a geografias e sistemas obscuros. É verdade que há realidades onde tal existe e, mesmo existindo eleições, o garante democrático não está salvaguardado. O Russia Unida de Putin, o MPLA em Angola, o Partido Popular do Cambodja ou Partido Socialista Unido da Venezuela não são os melhores exemplos de brisa democrática. Mas existem situações com outras características, como o ANC, na África do Sul, que mais do que um autoritarismo camuflado, vinga uma identificação quase perfeita com a sociedade e história daquele país. Uma relação que tem sido delapidada, mas que ainda vinga.

Já o Partido Liberal do Canadá, o Partido Liberal Democrático do Japão, a CSU na Baviera, ou PSD na Madeira, são exemplos de que é possível haver democracia, desenvolvimento, mesmo que não exista alternância. Posto isto, conceptualmente, nada de errado haverá nesta hegemonia do partido de Mário Soares. Mas é inequívoco que o Portugal de 2026, será essencialmente responsabilidade do PS. Para o bem ou para o mal. Não há desculpas.

Sondagens

Um facto que os actores políticos sabem perfeitamente, mas tentam disfarçar, e que os eleitores teimam em não aprender: os estudos de intenção de voto são credíveis, na sua generalidade. Mas a opinião é dinâmica, e mais do que a “fotografia do momento”, as sondagens servem para influenciar e condicionar o futuro.

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