O Parlamento aprovou, a 11 de janeiro e por proposta do Governo, com os votos do PS, do BE e da CDU, uma nova lei que prevê o levantamento do sigilo bancário, com o envio anual ao Estado e às Finanças do saldo das contas dos residentes em Portugal, que, num mesmo banco, ultrapassem os 50 mil euros.

Pretende-se, inclusive, que arranque muito em breve a possibilidade de as Finanças receberem esta informação relativa a 2017 e 2018, para que se forme um histórico que permita comparar a evolução dos valores das poupanças dos cidadãos.

Por outras palavras, este diploma obriga as instituições financeiras a reportar automaticamente e anualmente ao Fisco os valores que um contribuinte residente em Portugal tenha nas várias contas que possam estar em seu nome e que excedem os 50 mil euros no final de cada ano civil.

Ou seja, quem tem poupanças ou participa em contas familiares acima deste valor verá essa informação ser fornecido às Finanças, que decidirá se existem ou não razões para uma inspeção ou para um exame mais completo e rigoroso da informação com movimentos das contas incluídos. Tudo em nome de um pretenso combate à fraude e à evasão fiscal.

A questão que se levanta é se a divulgação destes nomes não coloca em causa, não só o sigilo bancário, como a proteção dos dados, também estes direitos consagrados na lei. E será que o levantamento do sigilo bancário de forma automática é benéfico para o sistema financeiro português? E qual a vantagem do ponto de vista fiscal, considerando que o Estado já detém a informação dos juros que cada cidadão recebe?

Há ainda outro problema que se agudiza com esta medida, que será o trazer ainda mais barreiras à criação de poupança, agravando os terríveis níveis baixos já existentes, ou podendo ainda provocar uma fuga de capitais para outros mercados, com todos os efeitos inerentes e nefastos para a nossa economia.

Por outro lado, o que este diploma vem intensificar são os riscos de ver circular pelo Estado a informação financeira dos cidadãos, antes circunscrita aos bancos e aos gestores de conta e que agora ficam à mercê do Fisco, abrindo as portas à devassa da vida dos portugueses (convém esclarecer que a lei aprovada não dá qualquer garantia sobre a forma como as Finanças irão proteger os dados dos cidadãos). Obviamente que este é um tema tão político quanto populista: a lei passou com os votos da ‘frente esquerda’, a meses das legislativas.

O que interessa reter neste tema é que o sigilo bancário é vital para a democracia. Para os direitos dos cidadãos. Para a sobrevivência do sistema financeiro. Quando falamos em poupanças, falamos na maioria das vezes em economia familiar, em titulares de contas que o são por afinidades familiares, nem sempre donos das aplicações.

O montante dos 50 mil euros é curto para justificar tamanho voyeurismo. Não é difícil de prever que o Fisco irá ficar entupido em análises de poupanças de depositantes e de cidadãos cumpridores. Porque, na realidade, é disso que falamos.