Foi com alguma surpresa (ou talvez não) que a proposta de Lei do Orçamento do Estado (“OE”) para 2022 veio a ser chumbada na Assembleia da República no passado mês de outubro de 2021, atirando com isso o País para uma crise política de contornos únicos, levando a que já perto do final do ano passado, o Presidente da República (PR) tenha dissolvido o Parlamento e, consequentemente, convocado eleições legislativas antecipadas, as quais se realizaram no passado 30 de janeiro de 2022. Era um cenário que o PR tinha dado como provável, em caso de “chumbo” do OE de 2022.

Em face deste cenário, e olhando para o resultado (quiçá surpreendente) que emergiu das eleições legislativas, iremos finalmente ter um Governo com capacidade efetiva de governação, resultado da maioria absoluta que o Partido Socialista obteve. No entanto, atendendo ao calendário político, dificilmente teremos um OE antes do final de março de 2022 ou, no limite, no início de abril de 2022.

Com isto o País perdeu algum tempo que urge recuperar, pois existe uma necessidade imperiosa de executar as políticas necessárias à recuperação económica de que Portugal tanto necessita.

Este ato eleitoral acabou por surgir num momento bastante delicado, face à situação económica e social que o País atravessa, onde se tem vindo a registar alguma recuperação, com um crescimento do PIB acima de 4%, mas que pode vir a ser comprometido devido à situação pandémica que se tem vindo a agudizar nas últimas semanas, com a proliferação da nova variante do vírus SARS-COV-2, a denominada variante Ómicron. Esta variante tem contribuído de forma relevante para o aumento exponencial no número de infeções diárias registadas em Portugal e com isso, com o agudizar de algumas restrições, as quais poderão ter algum impacto no crescimento económico do País, pois podem condicionar a recuperação de alguns setores vitais da nossa economia, como por exemplo, o setor do turismo, em particular a hotelaria e a restauração.

Neste contexto, poder-se-á questionar o que podemos esperar desta segunda versão do OE 2022 ou, dito de outra forma, no seu Take 2?

Naturalmente, o tecido empresarial e as famílias continuam a desejar que sejam contempladas medidas de alívio (estímulo) e de simplificação fiscal, como forma de poder potenciar, também por essa via, o almejado processo de recuperação económica.

Será de admitir, igualmente, medidas que visem a alavancagem de medidas de apoio (v.g. subsídios, diferimentos de pagamentos de impostos, moratórias, etc.), para os setores que possam vir a ser significativamente afetados com esta nova vaga da pandemia.

Contudo, e tendo por base um Survey realizado pela EY poucas semanas antes da apresentação da Proposta de Lei do OE 2022 em outubro de 2021, dir-se-ia que todas as medidas que aí foram “pedidas” pelo tecido empresarial fariam todo o sentido em poderem agora vir a ser contempladas, dado que a maioria (para não dizer todas) acabaram por não vir inscritas na versão apresentada pelo anterior Executivo.

De facto, existe um conjunto de temas que poderiam agora vir a ser contemplados no texto do OE 2022, pois se se fizer uma retrospetiva aos últimos Survey’s realizados pela EY sobre esta temática, facilmente se constata que existem matérias fiscais que ainda podem ser objeto de alteração por parte do futuro Executivo, uma vez que as mesmas ainda não aconteceram. Deste modo, medidas que visem premiar, pela via fiscal (v.g. sob a forma de um crédito fiscal), empresas que tenham mantido, ou aumentado, o nível de emprego, a revisão do regime das tributações autónomas em sede de IRC, a revisão (ou, quiçá, a eliminação, dado ser um tributo que foi criado como tendo uma natureza temporária e excecional) dos escalões da Derrama Estadual, são apenas exemplos daquilo que pode ser feito e que, por certo, seriam bem-vindas aos olhos dos agentes económicos. É algo que a EY tem vindo a dar sistematicamente eco, mas ainda sem efeito prático.

Estas medidas, aliadas a uma maior simplificação no cumprimento das obrigações fiscais, por exemplo ao nível das novas regras do teletrabalho e da forma de documentar as compensações atribuídas pelas entidades patronais aos respetivos colaboradores, podem de facto levar-nos para um OE tido como positivo para os vários agentes económicos do País.

É público que a margem disponível que o futuro Governo dispõe para aliviar impostos é curta, e por isso o equilíbrio entre uma gestão adequada das finanças públicas e o necessário desejo de estímulo, pela via fiscal, que deve ser induzido na economia é um objetivo auspicioso, mas que deve sempre nortear a atuação política de um Governo que pretende incentivar uma política de crescimento económico, sem esquecer a mais que provável necessidade de reforçar os apoios e estímulos financeiros aos setores que possam ser mais afetados com a nova vaga da pandemia.

Naturalmente, sabemos ainda que uma boa execução do PRR, que passe por um efeito bem sentido na economia real, afigura-se como fundamental para o relançamento da economia, e por isso é expectável que o OE possa ainda contemplar algumas medidas nesse sentido.

Resta-nos, por isso, aguardar o conteúdo da nova proposta de Lei do OE para 2022 de forma a confirmar (ou não) se esse desígnio se cumpre ou não.