A paisagem tem vindo a ser reconhecida como um valor natural e cultural identitário de uma comunidade. A Convenção Europeia da Paisagem (CEP) designa “paisagem” como uma parte do território, tal como é apreendida pelas populações, cujo caráter resulta da ação e da interação de fatores naturais e humanos. Para o arquiteto paisagista Gonçalo Ribeiro Telles, a paisagem é tudo, “é um diagnóstico de uma organização humana do território. É uma construção artificial, baseada nas leis da Natureza”.

A construção da paisagem humanizada contemporânea faz-se cada vez mais com dinâmicas urbanas e paisagísticas geradas em abordagens inovadoras e integradoras, com o recurso a Soluções Baseadas na Natureza (Nature-Based Solutions).

O Programa das Nações Unidas para o Ambiente e a Comissão Europeia definem-nas como importantes para a agenda global de desenvolvimento sustentável, porque oferecem o potencial para enfrentar, de forma eficiente, os desafios relacionados com as alterações climáticas, insegurança alimentar e hídrica, impactos e ameaças à saúde e ao bem-estar humano, ao mesmo tempo que reduzem a degradação ambiental e a perda de biodiversidade.

Estas devem ser absorvidas pelas políticas de ordenamento para que seja possível o equilíbrio ecológico e a polivalência dos espaços públicos, que vão para além parques e jardins públicos, em síntese, embelezamento urbano. A solução passa por um urbano ordenado como conjunto orgânico que corresponde a um certo princípio de organização social e cultural de uma paisagem, onde o espaço natural e o espaço edificado têm o mesmo valor.

Ou seja, estratégias de desenho urbano que permitam a correta integração dos edifícios no ambiente circundante, tirando partido das especificidades naturais do local, criando espaços públicos alternativos, em equilíbrio com as atividades económicas e bem-estar social.

Como forma de fomentar estas práticas é necessário olhar com atenção para ações locais a decorrer em Lisboa e no Porto, onde a academia e a sociedade aprendem com a natureza para garantir os princípios de uma paisagem para o nosso futuro coletivo.

O Festival Regador é a oportunidade para conhecer projetos em curso em Lisboa, percorrendo intervenções focadas no espaço público em processos de cocriação de novas relações urbanas e sociais, garantindo como prioridade o bem-estar físico, mental e social das pessoas na sua relação com a alimentação, mobilidade e economia solidária.

Neste, destaca-se a Agrofloresta da Bela Flor, um projeto piloto de coprodução do espaço público com a comunidade no bairro de Campolide; a Horta FCUL sensibiliza e difunde a prática da permacultura urbana com a investigação académica; as Hortas LX promovem o consumo de uma alimentação saudável proveniente de uma agricultura orgânica e responsável na cidade; a Horta do Alto da Eira, na Penha de França, é um ponto de encontro de pessoas e projetos de agricultura coletiva; e a Rizoma, uma cooperativa comunitária, “uma rede de apoio, construindo uma comunidade que responde a necessidades básicas de consumo de forma económica, ecológica e socialmente justa”.

No Porto, o desenho de corredores saudáveis, como o da Campanhã, pretende suprimir a fragmentação e desconexões locais dos bairros do Cerco, Falcão e Lagarteiro, com o envolvimento dos cidadãos locais.

Em suma, parafraseando Gonçalo Ribeiro Teles, “a cidade e as áreas de características metropolitanas necessitam dum planeamento eficaz e que permita responder à complexa problemática duma época de profunda transformação social e económica, o que se traduzirá na construção de novas paisagens”.