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Passos Coelho explica decisão de não se recandidatar à liderança do PSD: “A minha obstinação não é com os lugares”

Está desfeito o tabu: concluída a “reflexão pessoal” na sequência do resultado (“mau e pesado”) das eleições autárquicas, Passos Coelho decidiu que não vai recandidatar-se à presidência do PSD. “Ficar seria oferecer com facilidade a caricatura de que estamos agarrados ao poder interno,” explicou. Mas a saída da liderança “não significa” que se vá “calar para sempre”.
3 Outubro 2017, 21h18

No discurso de abertura da reunião do Conselho Nacional do PSD, esta noite, Pedro Passos Coelho confirmou que não vai recandidatar-se à presidência do partido, na sequência da derrota nas eleições autárquicas de 1 de outubro. “Esta minha decisão prende-se não apenas com a assunção de responsabilidade nacional, mas também com a ideia de que […] a afirmação de uma nova liderança por parte do PSD […] terá melhores possibilidades de progressão e sucesso do que uma que eu pudesse encabeçar. Esta é a decisão que faz sentido,” explicou. Ressalvando contudo que “o partido não ficará em gestão”, na medida em que não apresentou a sua demissão.

A decisão de Passos Coelho foi comunicada em primeira instância “aos órgãos próprios”, especificamente a Comissão Permanente Nacional e a Comissão Política Nacional, durante as reuniões que se realizaram hoje para analisar os resultados eleitorais. Perante o Conselho Nacional, Passos Coelho começou por explicar a forma como decorreu a “reflexão pessoal” que culminou na decisão de não se recandidatar à liderança. “Prometi na noite das eleições que faria uma reflexão sobre os seus resultados e as implicações que poderiam ter, nomeadamente para uma decisão de recandidatura minha à liderança do PSD. Procurei que essa reflexão fosse madura e, ao mesmo tempo, rápida, de modo a não deixar o partido numa situação de suspensão sobre a minha decisão,” afirmou.

 

“Pode eventualmente achar-se […] que tendo igualado o número de votos de 2013, o resultado possa não ter sido afinal tão mau quanto se pintou. Mas eu creio que o resultado foi pesado e isso é iniludível.”

 

“Mas queria começar por dizer, por confessar a minha surpresa com o resultado das eleições. Não sei se isso aconteceu ou não com algum de vós, mas confesso que este não foi um resultado que eu esperasse. O resultado pode, dois dias depois, não parecer para o PSD tão pesado quanto se afigurou no domingo à noite. Pode eventualmente achar-se, já houve quem tivesse feito essa observação, que tendo igualado o número de votos de 2013, o resultado possa não ter sido afinal tão mau quanto se pintou. Mas eu creio que o resultado foi pesado e isso é iniludível,” salientou Passos Coelho. Ao nível nacional, de facto, o PSD (incluindo as coligações formadas com o CDS-PP) conquistou mais 1.467 votos (de 1.575.257 para 1.576.724 no total) do que nas eleições autárquicas de 2013 – como apurou o Jornal Económico -, traduzidos numa percentagem menor (de 31,53% para 30,46%) porque a abstenção diminuiu (de 47,4% para 45,03%) em 2017.

“Nós só temos um resultado comparável com o que obtivemos em número de presidências de câmaras, em 1982, na sequência, de resto, de uma situação muito complexa em que a própria solução de Governo liderada pelo PSD estava em grandes dificuldades e, um ano depois, viria a conhecer o seu termo, justamente em consequência também do resultado de eleições autárquicas, na altura em função da reação do nosso parceiro de coligação. Mas foi o pior resultado que tivemos, em 1982,” recordou. “Eu julgo que isto chega, para quem quer que goste de assumir responsabilidades – e eu, como sabem, gosto de assumir responsabilidades -, não faculta muita margem de manobra. O resultado foi mau e foi pesado.”

 

“Houve outros que tiveram resultados ainda mais pesados do que nós, que foram praticamente varridos nas eleições, e parecem não estarem preocupados com isso. Mas isso é um problema deles, evidentemente. […] O Partido Comunista perdeu muito, mas acha que há outras coisas que compensam essas perdas.”

 

Seguiu-se uma alusão ao fracasso eleitoral do PCP. “Claro que também se poderá dizer que houve outros que tiveram resultados ainda mais pesados do que nós, que foram praticamente varridos nas eleições, e parecem não estarem preocupados com isso. Mas isso é um problema deles, evidentemente. O Bloco de Esquerda não perdeu muito, porque não tinha muito a perder. O Partido Comunista perdeu muito, mas acha que há outras coisas que compensam essas perdas. Mas isso são as leituras que os outros fazem.”

Em relação ao CDS-PP, admitiu que o resultado de Assunção Cristas superou as suas expectativas. “Julgo que o CDS não terá tido um resultado tão ambicioso quanto se procurou pintar, mas ninguém de bom senso diminuiria o resultado que o CDS teve. Em particular o resultado que a sua líder pessoalmente teve, em Lisboa, e que está muito além daquilo que seria, parece-me, o resultado do CDS. Pelo menos a avaliar pelo resto do país.”

 

“As eleições têm sempre uma leitura nacional e têm um significado nacional. Estes resultados, portanto, também responsabilizam e penalizam a liderança nacional.”

 

Na perspetiva de Passos Coelho, “o resultado final trouxe derrotas que ninguém tinha previsto e trouxe vitórias que ninguém teria considerado muito prováveis. E isto, ‘per si’, como tive ocasião de sublinhar na noite das eleições, atesta bem o carácter local de cada uma das eleições. Porém, não há nenhuma dúvida que se o carácter das eleições é local, como sempre afirmei, as eleições têm sempre uma leitura nacional e têm um significado nacional. Estes resultados, portanto, também responsabilizam e penalizam a liderança nacional.”

“Disse com muita antecedência que não me demitiria, qualquer que fosse o resultado,” prosseguiu. “Já disse que não tinha previsto um resultado tão mau. Mas mantenho o que disse. O partido não ficará em gestão. Eu não apresentei a minha demissão. Mas como não saio ileso deste resultado, não posso deixar de tirar dele consequências para futuro. E evidentemente, para mim, torna-se muitíssimo claro que essa consequência se exprime na minha decisão de não me apresentar a uma recandidatura dentro do PSD.”

“Esta minha decisão prende-se não apenas com a assunção de responsabilidade nacional, mas também com a ideia de que na avaliação que faço das circunstâncias políticas, na sequência deste resultado, a afirmação de uma nova liderança por parte do PSD, bem como da estratégia que lhe estará associada, terá melhores possibilidades de progressão e sucesso do que uma que eu pudesse encabeçar. Esta é a decisão que faz sentido,” justificou.

 

“Ficar seria oferecer com facilidade a caricatura de que estamos agarrados ao poder interno […] e que, nessa medida, estaríamos simplesmente a resistir às coisas, em vez de estar a construir um horizonte que pudesse trazer uma amplitude de resultado maior.”

 

Passos Coelho referiu-se depois ao que considera ser “o principal problema da atual situação”, dizendo que não seria “resolvido” se continuasse na liderança do partido: “Se eu permanecesse vitorioso à frente do PSD, como líder do PSD, em vez de estar a construir uma alternativa de Governo, estaria em permanência a combater o preconceito e a ideia feita de que estava agarrado ao poder do partido, que estava a resistir a ceder o lugar a quem tem melhores ideias, melhor estratégia, para levar o partido a melhor porto.”

“Julgo que já dei bastas provas de que a minha obstinação não é com os lugares. Sou muito obstinado nas coisas que penso, nas minhas convicções, mas não em relação aos lugares. Fui obstinado ao não me demitir do Governo, numa altura em que achei que essa demissão colocaria em risco todo o país e não apenas o bem-estar do PSD ou o bem-estar do então primeiro-ministro. Mas isso é diferente, não é essa a posição que eu ocupo hoje,” explicou. “Ficar seria oferecer com facilidade a caricatura de que estamos agarrados ao poder interno – eventualmente, como já foi sugerido, explorando a gratidão junto dos militantes pelas lutas e pelos resultados passados – e que, nessa medida, estaríamos simplesmente a resistir às coisas, em vez de estar a construir um horizonte que pudesse trazer uma amplitude de resultado maior.”

Nas observações finais, Passos Coelho ressalvou que não deixará de “lutar” pelas ideias que defendeu nos últimos anos, enquanto foi primeiro-ministro e presidente do PSD. “O facto de não me recandidatar à liderança do PSD não significa que me vá calar para sempre. Não deixarei de continuar a lutar pelo meu partido e pelo meu país da melhor maneira que souber,” prometeu, gerando a primeira salva de palmas dos membros do Conselho Nacional. “Mas não ficarei cá a rondar,” sublinhou.

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