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Poder ganho pelas redes sociais na pandemia é ameaça à democracia, diz Francisco Louçã

O economista alerta que o isolamento imposto pela pandemia veio dar mais força a plataformas como o Facebook ou o Whatsapp. Entidades que comercializam os dados dos utilizadores, pondo em causa a democracia.
24 Março 2022, 19h55

Francisco Louçã, conselheiro de Estado e fundador do Bloco de Esquerda, considera que o isolamento imposto pela pandemia de Covid-19 deu mais força às plataformas digitais, como o Facebook, o Instagram ou o Whatsapp. Empresas que, diz o professor catedrático, ameaçam a democracia através da comercialização dos dados pessoais dos utilizadores.

“O isolamento provocado pela Covid-19 multiplicou a virtualização da vida, tendo essa situação conferido um poder gigantesco a estas plataformas de comunicação como nunca existira, até agora, a nível mundial”, afirmou Francisco Louçã, esta quinta-feira.

A ideia foi manifestada no terceiro debate do ciclo quinzenal “Pensar a Economia”, organizado pelo Instituto de Direito Económico Financeiro e Fiscal (IDEFF) da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa com o apoio da Caixa Geral de Depósitos (CGD) e da Ordem dos Economistas, além do Jornal Económico como media partner.

“Estas plataformas – nas quais interage um terço da população mundial – aproveitaram a pandemia para dar passos importantes na projeção da sua visão sobre a economia da comunicação”, contribuindo para cimentar “o papel das redes sociais como organizadoras de todas as atividades”, defende o professor. Entidades, diz, que “extraem e comercializam dados pessoais dos seus utilizadores como instrumentos de comércio e de atividades económicas”.

Francisco Louçã refere ainda que “os danos que estas plataformas podem causar à democracia são imensos, pois resultam de empresas que são muito mais poderosas que os governos da maior parte dos países e com uma capitalização de dois triliões de dólares”, salientando que “só o valor do Facebook é aproximadamente o que seria a produção e os rendimentos de 50 milhões de portugueses”.

“É a primeira vez na história que temos uma empresa que tem mais de metade da população mundial como seus clientes”, disse, mostrando um mapa onde as plataformas Facebook e Whatsapp, pintadas a azul e a verde, respetivamente, dominam nos vários países.

O economista fez ainda referência a um universo relacionado com estas plataformas: o metaverso, um conceito que já existe há algum tempo mas que o fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, decidiu adotar para mudar o nome da empresa que lidera para Meta. Um mundo virtual, mas que permite recriar uma vida real, nomeadamente relações pessoais e profissionais.

“A mais perturbante, a mais diferenciadora dos nossos dias é a ambição do metaverso”, isto porque é “um programa, uma civilização para o qual estamos a ser empurrados”, disse. Aqui tudo muda: o trabalho, a cultura e até a linguagem. “Escrevemos e falamos de forma diferente”, diz, naquele que é um “lugar novo na nossa vida”. E, “em consequência, a legitimação da relação social passa a ter uma estrutura diferenciadora”.

Todos estes temas são abordados no livro de Francisco Louçã “O Futuro Já Não É O Que Nunca Foi – Uma Teoria do Presente”, tendo sido desafiado a fazer uma releitura da obra à luz do contexto atual, no âmbito deste ciclo de conferências.

“O livro investiga, entre outros aspetos, a forma como o capitalismo de vigilância se instalou no século XXI”, afirma, acrescentando que “há empresas de seguros que hoje usam informação pessoal do Facebook para determinar se a pessoa é mais ou menos fiável, sendo que também assistimos a empresas que recrutam a partir de informação que está disponível no Instagram e noutras redes sociais”.

Para o professor de economia, “a nossa vida passou a ter um tempo de atenção num admirável mundo novo: basta ver que em Portugal, em média, as pessoas estão mais tempo nas redes sociais do que a dormir”.

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