Portugal está a entrar na época do ano dominada por incêndios florestais e por intervenções televisivas, repetitivas e enfadonhas, contra a plantação de eucaliptos. Entre as percas vividas, e pagas, por milhares de proprietários florestais e os delírios de quem nunca investiu um cêntimo na plantação de nada, vai a distância entre dois mundos que se vão afastando cada vez mais.

Ora, as várias questões que estão na origem da situação que vivemos arrastam-se há mais de um século e vêm prosseguindo. O progressivo abandono do mundo rural, a dimensão da propriedade, a ausência de capital que permita compensações monetárias (tornas) aquando das partilhas, e a progressiva diminuição da rentabilidade da propriedade rústica.

Quando, nos anos cinquenta do século passado, a agricultura começou a assegurar uma cada vez mais magra subsistência aos pequenos proprietários rurais, todos estes problemas se agravaram com a emigração e o êxodo para as cidades.

Por herança passei a ser proprietário rural e florestal. Por isso, interessado.

Entre o Tejo e o Douro a dimensão média da propriedade rústica é de 0,6ha e a dimensão média por exploração/proprietário é de cerca de 6ha. Média claramente influenciada por algumas grandes propriedades, principalmente no distrito de Castelo Branco. Refira-se que representando as Regiões Norte e Centro 54% da área total de Portugal, concentram 85% dos prédios rústicos existentes em Portugal.

Sendo os dados referidos acima os dados oficiais, merece a pena dizer. É verdade que o Estado vem há várias décadas a legislar no sentido de evitar o fraccionamento da propriedade. Já no Código Civil de 1966 se proibia o fraccionamento de propriedades com área inferior à unidade de cultura. Esta estatuição de pouco, ou nada, valeu. Num país pobre e descapitalizado, os cidadãos foram produzindo milhares de situações de compropriedade e, em muitos casos, de manutenção, por décadas, de heranças indivisas.

A proliferação da compropriedade é de tal ordem que verdadeiramente me leva a duvidar se as áreas referidas acima para a dimensão média da propriedade são reais ou, antes, tomaram por referência as áreas constantes dos artigos matriciais. É que, a ser assim, bem que podemos aumentar o número de proprietários e diminuir a área de que cada um é proprietário.

Se tivermos presente que na matriz Predial estão inscritos cerca de 11,5 milhões de prédios rústicos e o Registo Predial tem registados apenas 50% destes, ficamos com uma ideia da irrelevância económica que a propriedade rústica assumiu para os seus titulares. De facto, estamos perante activos muito significativos, não produtivos, e geradores de elevada despesa pública, nomeadamente por força dos incêndios.

Durante décadas fomos constituindo compropriedades, fomos abandonando as propriedades e estas foram, de facto, ficando sem quem sobre elas exercesse a posse e, também, sem que sobre elas incidisse qualquer transacção. Importa agir sobre isso, e alguma coisa vem sendo feita e, diga-se, na direcção certa.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.