Agora que o processo eleitoral passou e com uma maioria absoluta do PS, que permite uma efetiva programação a quatro anos, é altura de nos focarmos nas tão necessárias reformas estruturais. As duas palavras têm uma certa má fama porque são sistematicamente utilizadas para se referirem única e exclusivamente a reformas na legislação laboral por forma a “flexibilizar” o mercado de trabalho.

Neste contexto o que significam sempre é facilitar os despedimentos e reduzir as compensações, reduzir o tempo e valor do apoio ao desemprego, travar a contratação coletiva, enfim, fazer com que o trabalho seja mais barato, com menos direitos, menos poder reivindicativo e maior instabilidade.

Hayek, Friedman, Thatcher, Reagan, foram alguns dos principais arautos desta visão. Em Portugal, o PSD da troika e, mais recentemente, a Iniciativa Liberal, colocam-se nesta linha, num país com uma das maiores desigualdades da Europa e onde o trabalho representa uma das mais baixas percentagens da riqueza nacional produzida.

Aqui, por reformas estruturais refiro-me a reformas que alteram de forma profunda a natureza das relações sociais, produtivas e infraestruturais do país. Que permitem que o país se torne, em permanência, mais competitivo, mais produtivo, mais robusto e resiliente economicamente, facilitando uma resposta eficaz no embate de novas crises.

Mais. Que o país se torne mais igual entre os estratos económicos e sociais e no seu território. Que alargue a base da pirâmide etária atraindo e retendo talento. Que garanta uma justiça mais célere e mais igual para todos. Que tenha uma particular atenção ao ensino e aos serviços de saúde, públicos e essencialmente gratuitos.

Tudo isto exige coragem política e não produz resultados imediatos. Por isso, uma maioria absoluta num momento de entrada, quase inédita, de fundos, é o momento certo para se tomarem algumas decisões.

Há muitas áreas fundamentais que dariam para vários artigos autónomos. Mas, para começo de conversa, ficam aqui alguns exemplos:

– Rever profundamente a Burocracia do Estado, dos seus processos, procedimentos, autonomia das instituições, tempos de resposta, etc..

– Avançar de uma vez por todas, e de forma consequente e inteligente, com a descentralização territorial e administrativa.

– Apostar decisivamente nos cuidados de saúde primários.

– Promover por todos os meios a formação e qualificação de adultos.

– Redefinir o modelo de Segurança social de forma a garantir que esta seja sustentável independentemente dos ciclos económicos.

– Apostar na ferrovia para se cobrir o país com uma rede de comboios que permita tornar próximo um país que está distante. Aproximar o país de Lisboa e, sobretudo, Lisboa do resto do país, contribuindo para a sustentabilidade ambiental e para o equilíbrio territorial.

Estes são apenas exemplos, de uma lista grande. Dever-se-ia refletir que país queremos daqui a cinco, dez, 20 anos, e traçar um plano de reformas estruturais (não o PNR que revemos todos os anos) que nos conduza a esse país. Este é um momento político único para o conseguirmos fazer.