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Teletrabalho – Quem e como se paga os custos adicionais do teletrabalho?

Parece-nos que a definição de uma percentagem da retribuição ou a definição de valor fixo a atribuir ao trabalhador, era o mecanismo mais apropriado e justo para regular esta nova realidade mais presente do teletrabalho.
15 Dezembro 2021, 07h15

Após meses de negociação e face à realidade emergente do teletrabalho, foi publicado no Diário da República no passado dia 6 de dezembro a Lei 83/2021 que visa adequar o regime estabelecido no Código do Trabalho relativamente ao teletrabalho, às necessidades atuais trazidas pela pandemia do vírus Covid-19 e pelas necessidades de distanciamento social que este encerra.

Concretamente, a pandemia trouxe a necessidade do teletrabalho e esta impôs aos trabalhadores em geral a necessidade de passar a trabalhar a partir das suas casas, recorrendo à eletricidade dos seus domicílios para iluminar e operar equipamentos naquilo que passou a ser o seu posto de trabalho, assim como, recorrendo à sua própria internet para poder comunicar com os colegas, associados a um conjunto de outros custos adicionais decorrentes do teletrabalho que anteriormente eram suportados pelas empresas e que agora, sem serem regulados, passariam a ser suportados pelos trabalhadores e não pelos beneficiários do trabalho.

Foi precisamente esta realidade que a Lei n.º 83/2021 tentou regulamentar estabelecendo nomeadamente que “as despesas adicionais que, comprovadamente, o trabalhador suporte como direta consequência da aquisição ou uso de equipamentos e sistemas, incluindo os acréscimos de custos com energia e da rede instalada no local de trabalho em condições de velocidade compatível com as necessidades de comunicação do serviço, assim como os custos de manutenção dos mesmos equipamentos e sistemas”, sejam integralmente compensadas pelo empregador.

Mas esta conceção legislativa representa um problema de prova substancial para os trabalhadores, uma vez que torna-se difícil estes, comprovadamente, conseguirem demonstrar os custos adicionais resultantes do teletrabalho versus o uso doméstico, especialmente, conseguir comprovadamente fazer a separação entre os custos domésticos /profissionais no que concerne às rubricas de energia, aquecimento, ar condicionado, uso e manutenção de impressoras, tinteiros e toner, custos associados à internet e sua velocidade. A questão acaba por ser, onde é que acaba o uso doméstico e onde começa o uso profissional e como se comprova esta distinção?

É do senso comum que não se consegue distinguir da conta da internet e da eletricidade, o que foi uso doméstico e o que foi uso profissional, e considerando a volatilidade dos custos mensais, os termos de comparação entre os gastos numa situação de pré-pandemia com a realidade do teletrabalho nunca será uma comparação linear e objetiva, razão pela qual, entendemos que os trabalhadores serão sempre prejudicados por esta definição legislativa.

Seria talvez um caminho mais viável, considerando que, com a publicação da Lei n.º 83/2021, o acordo para prestação de teletrabalho depende sempre de formalização por intermédio de acordo escrito, a definição por acordo, e à partida, de uma percentagem sobre a retribuição ou um valor fixo, de modo a compensar o trabalhador por todos os custos adicionais a incorrer pelo regime de teletrabalho. A definição de uma percentagem sobre a retribuição ou valor fixo seria sempre a forma mais fácil, menos trabalhosa e potencialmente mais justa (porque reflete um acordo entre as partes) de conseguir compensar os trabalhadores pelos custos inerentes ao teletrabalho, assim como, permitiria uma maior transparência fiscal e a possibilidade da razoabilidade desta percentagem ou valor fixo poder ser aferida pelos tribunais, pela AT e pela própria DGERT em caso de irregularidades ou falta de acordo entre empresa e trabalhador quanto à percentagem ou valor fixo a determinar.

Parece-nos que a definição de uma percentagem da retribuição ou a definição de valor fixo a atribuir ao trabalhador, era o mecanismo mais apropriado e justo para regular esta nova realidade mais presente do teletrabalho, ao invés, a Lei n.º 83/2021, em nosso entender mal, “empurrou” para os trabalhadores o ónus de, comprovadamente, demonstrar os custos adicionais incorridos pelo teletrabalho, algo que, conforme já vimos acima, não é fácil de demonstrar, o que, na ausência de comprovação, abre caminho para as empresas não suportarem estes custos (por não se encontrarem comprovados), e assim legitimar a passagem dos custos do trabalho das empresas (beneficiárias do trabalho) para os trabalhadores.

Vale a pena pensarmos, e retificarmos isto, porque o teletrabalho é uma realidade que veio para ficar e que a própria sociedade civil precisa de um modelo justo e transparente no que concerne ao ressarcimento dos custos que este modelo acarreta e onde este se possa desenvolver.

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