Na calada de Agosto

A candura pérfida tem sido o cavalo de Troia das causas fracturantes. O caderno de encargos da agenda jacobina de desconstrução do nosso modelo social faz o seu caminho perante uma perigosa apatia e outro tanto de ignorância laxista. O ataque à vida com o aborto e a eutanásia, à familia com a destruição das convenções naturais de sempre, à identidade com a imposição da profusão dos ditos géneros, à diversidade com a ditadura do politicamente correcto, moldam a sociedade nova e cada vez menos livre.

A imposição radical do relativismo ético não se contenta com o relativismo moral já instalado, tendo em conta o potencial destruidor de um cenário amoral. É, portanto, a amoralidade a nova ambição dos novos ditadores e inquisidores.

Vem isto a propósito da onda que se faz sentir, primeiro na Europa e agora em Portugal, da relativização da pedofilia. Sabendo quem é Cohn-Bendit, o que defendeu neste capítulo logo após o Maio de 68, e o papel central que continua a desempenhar nesta agenda destruidora, não será surpresa esta tentativa de branqueamento da pedofilia. Em Lisboa, há sempre alguém atento e pronto a seguir enormidades destas. No caso em apreço, a Provedoria de Justiça, revela-se o ninho de serpentes onde se desenvolve este veneno social.

Como comecei por dizer, a perfídia disfarça-se de candura. O Provedora alega a crença na reabilitação, no arrependimento, na defesa do bom nome, na reinserção social para limpar a folha a pedófilos. Parece quase bem intencionada, não estivesse a insultar as crianças abusadas, as suas familias e cuidadores, a pôr em risco a segurança de mais crianças, a perverter o sagrado princípio da protecção dos mais fracos e vulneráveis; mas, estes são secundários para a Provedora e corja que a acompanha.

O importante, é estar em linha com a agenda dominante, ainda que isso queira dizer branquear o crime mais hediondo. O importante é também atirar sobre Paula Teixeira da Cruz e a sua legislação de rigor sobre a pedofilia. O importante passa completamente ao lado da justiça que dizem prover e do interesse dos portugueses e de Portugal. A Provedora e o seu ninho de serpentes não reunem as condições mínimas para o desempenho do mandato, não honram a justiça, não merecem o mínimo indispensável de confiança dos cidadãos.

O fogo em que ninguém se quer queimar

Fiquei sinceramente feliz por não termos assistido à perda de vidas humanas no fogo da Serra de Monchique. Digo, sem problemas, que o Governo, depois das pesadas responsabilidades que teve na catástrofe de Pedrógão, acautelou com sucesso o mais importante. Relativizar isto, seria uma estupidez ou uma desonestidade.

Este facto positivo não isenta o Governo do julgamento sobre o incêndio propriamente dito. Sabemos que há fogos incontroláveis e que países desenvolvidos com França, Austrália e EUA sofrem com incêndios de proporções dramáticas. Sabemos que o clima é o que é, e nem sempre ajuda. Dito isto, terá funcionado bem o dispositivo de combate a incêndios? Será normal virmos a saber de corporações paradas durante cinco horas sem ordens definidas? Não se imporá um esclarecimento cabal sobre as contratações de meios, verbas envolvidas e adequação dos mesmos? Desta vez não puderam culpar os “eucaliptos de Cristas”, o que falhou então?

Olhando para a lastimável prestação política e humana de Costa durante a crise, impõe-se reconhecer o que melhorou, a salvaguarda de vidas humanas, e a exigência absoluta sobre tudo, e tanto, que correu escandalosamente mal.

Les jeux sont faits!

Pedro Santana Lopes está de volta. Goste-se ou não, coragem não lhe falta. Passada a barreira psicológica dos 60, Santana Lopes continua inquieto e irreverente. Nunca escondeu que o risco o seduz, e essa perigosa sedução leva-o a esta nova aventura.

Para quem, como eu, se dedica ao estudo da realidade política, o quadro português ficou mais interessante. As experiências de novos partidos não funcionaram até agora em Portugal, apesar do êxito temporário do PRD. Portanto, ou se repete o fracasso de Manuel Monteiro, ou teremos um fenómeno novo. Tudo dependerá do que quererá mesmo Santana Lopes fazer, e de como o fará. Se a geringonça de esquerda é formada por três partidos, não poderá a direita vir a organizar-se da mesma forma?

O desafio de Santana Lopes é o enquadramento ideológico, por um lado, e as tropas que conseguir juntar, por outro. Se é verdade que existe um espaço à direita por preencher em Portugal, o do chamado populismo europeu, não é menos verdade que o público português não lhe sente a falta, nem Santana Lopes é o personagem para esse papel.

A receita, creio, passará por um pot-pourri de securitarismo cheio de humanidade, de liberalismo proteccionista, de laxismo regulado, de brandura rigorosa, enfim, um breviário de contradições que satisfaça as correntes mais voláteis da opinião pública, tendo como única âncora sólida o inegável carisma de Santana Lopes.

À direita, principalmente, o statu quo do momento poderá tremer. O carisma de Santana Lopes, o seu faro político, o sentido de oportunidade e a rapidez de intervenção, porão em causa o registo morno e redondo de Assunção Cristas e tornarão insuportável a completa inexistência de Rio à frente do PSD. Como Santana tanto gosta, les jeux sont faits!

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.