A notícia de que o carimbo roubado por um jiadista português na Escola Secundária  Stuart  Carvalhais, em Massamá, no concelho de Sintra, tinha sido utilizado para financiar o terrorismo voltou a trazer a reflexão sobre o fenómeno terrorista para o domínio público.

Os contornos já conhecidos do episódio apontam para que o carimbo roubado tenha sido utilizado para falsificar certificados de habilitações literárias que, uma vez enviados para universidades britânicas, permitiram à célula terrorista portuguesa do bairro de Leyton, em Londres, receber subsídios destinados a estudantes estrangeiros. Como os jiadistas não se deram ao trabalho de pôr os pés nas aulas, não é difícil perceber que os subsídios não foram utilizados para o fim a que estariam destinados, mas sim para financiar as atividades da célula, designadamente para custear as viagens dos terroristas e dos novos membros, por eles recrutados, para a Síria e para a aquisição de material bélico.

Os dados já conhecidos permitem perceber que o terrorismo que recorre a motivações religiosas tem os pés muito bem assentes na terra no que diz respeito às estratégias para obter os fundos que lhe permitem alimentar a falácia de que se alimenta. Uma falácia assente no pressuposto de que o Ocidente está em luta contra o Islão. Daí a fatwa de Abu Qutadah – The Islamic Legal Perception of the September 11th Events – a justificar a legalidade de um ato cuja preparação custou mais de meio milhão de dólares.

A notícia deve, ainda, conduzir a uma outra reflexão. Assim, de acordo com fontes oficiais, o autor do roubo do carimbo, tal como o seu irmão, morreram ao serviço do Daesh. Porém, as suas viúvas e filhos, continuam vivos e, como se julgam com direito à nacionalidade portuguesa, pretendem vir – coisa diferente de regressar – para Portugal.

Uma questão delicada, uma vez que envolve direitos humanos, questões éticas e direitos civis. Um assunto com que outros países europeus já se viram confrontados, sem que as estratégias seguidas sejam objeto de consenso.

De facto, os programas de desradicalização e de acompanhamento dos jiadistas – homens e mulheres – que regressam do defunto Estado Islâmico, para além de onerosos, estão longe de garantir a segurança nesta parte do mundo.

Na verdade, muitos dos que se dizem arrependidos só o fazem para beneficiarem das condições que lhe são proporcionadas pelo sistema que continuam a querer destruir. No livro “Terrorismo Religioso. A Realidade no Feminino”, apresentei números e casos que exemplificam essa realidade. Uma situação tanto mais grave quanto as prisões, os campos de refugiados e os bairros periféricos ou suburbanos continuam a ser campos férteis para o recrutamento daqueles que ficaram para trás e se sentiram socialmente marginalizados.

Uma palavra dada a quem está fragilizado pode ser usada, tal como o carimbo roubado em Massamá, para arregimentar novos membros para a causa terrorista. Quem perdeu a confiança nas instituições está recetivo a participar na sua destruição. Esta é uma realidade que terá de fazer parte das preocupações dos governos e populações do Mundo Ocidental, nomeadamente de um crescente número de muçulmanos que não se reveem nas ações terroristas.

David Rapoport escreveu que cada vaga de terrorismo global durava cerca de quatro décadas. É fácil prever que a atual, como recorre a elementos religiosos, vai ser bem mais demorada. No caso em apreço, um simples carimbo serviu para mostrar que de nada vale fingir ignorar a ameaça terrorista.