1. A nova Assembleia da República terá, por inerência, de nomear, de harmonia com o princípio da representação parlamentar, cinco membros para o Conselho de Estado. Esse princípio reúne numa lista, depois votada por todos os deputados em voto secreto, três nomes indicados pelo maior partido, o PS, e outros dois pelo segundo, o PSD.

A quota dos sociais-democratas estava preenchida por Rui Rio e Francisco Pinto Balsemão. A do PS, consequência da chamada geringonça, juntava até aqui Carlos César, presidente do partido (António Costa tem um lugar à parte como primeiro-ministro), com a cedência de posições ao PCP e BE. Esses dois lugares eram ocupados pelo histórico comunista Domingos Abrantes e pelo fundador bloquista Francisco Louçã.

Notícias já publicadas dão conta de que o PS não estará disponível para renovar essas cedências. A Carlos César, consequência agora da maioria absoluta do PS, poderá juntar-se Manuel Alegre e um outro nome. PCP e BE ficariam, assim, de fora do círculo restrito que o Presidente da República convoca e ouve antes das grandes decisões do Estado.

2. Fará bem o PS em alterar a sua posição? Em minha opinião, sim.

Primeiro, porque a correlação de forças no Parlamento mudou. Hoje, o PCP e o BE já não só não fazem parte da base de sustentação parlamentar do governo, como, sobretudo, nem sequer são, como eram, os terceiro e quarto partidos mais votados.

O PCP tem apenas seis deputados e o BE cinco. Maiores grupos parlamentares possuem o Chega, com doze deputados, e a Iniciativa Liberal, com oito. Esse é o ponto concreto que o PS, se quisesse dar uma explicação, e não precisa, poderia invocar.

3. Não é pelas razões acima descritas que entendo que PCP e BE não devem ter acesso ao Conselho de Estado. Também é por isso, evidentemente, porque se transformaram no quinto e sexto partidos mais votados, descendo na escolha dos portugueses – mas é, acima de tudo, pelas posições que assumem, claramente antieuropeias e anti-NATO, contrárias ao sentir da maioria dos portugueses, tornadas bem evidentes durante as últimas semanas e na guerra que a Rússia desencadeou na Ucrânia.

A hipocrisia do BE e o descaramento ideológico do PCP não têm cabimento no Conselho de Estado. Que fiquem confinados ao Parlamento, chega.

4. O problema do PCP – e do BE no primeiro momento da análise à guerra – não é defenderem alguns pontos da visão russa sobre o conflito. O que choca é a não condenação imediata da agressão, a cegueira ideológica que a ser algum dia aplicada num governo levaria Portugal ao desastre económico e social em pouco tempo.

Estes partidos não comungam uma visão europeísta, cimento da União a 27. Eles não querem, simplesmente, mudar a UE. Gostariam de poder acabar com ela!

O PS, partido pró-europeu, que se ligou, por necessidade e oportunismo, a estas duas forças, deve cortar agora com PCP e BE porque também aqui há linhas vermelhas. O Conselho de Estado é uma boa oportunidade para demonstrar isso.