Esta semana assistimos ao que poderá ser um momento de viragem nas relações diplomáticas e económicas entre Portugal e a China. O Conselho Nacional de Segurança do Ciberespaço aprovou uma deliberação que exclui das redes 5G nacionais as tecnológicas oriundas da China e de outros países que não façam parte da União Europeia, da NATO e da OCDE.

De acordo com a Lei das Comunicações Eletrónicas, a deliberação terá de ser aplicada pelo regulador do sector, a Anacom. Porém, a principal surpresa nesta deliberação não é a decisão de afastar as empresas não-ocidentais (leia-se chinesas) das infraestruturas críticas de telecomunicações – que tem aplicada em vários países ocidentais, sob forte pressão por parte dos EUA –, mas sim a extensão dessa exclusão. De facto, a deliberação prevê que seja excluída qualquer empresa que dependa, na sua cadeia de fornecimentos, de países fora da União Europeia, NATO e OCDE.

Por outras palavras, as tecnológicas ocidentais que dependam de fornecedores da China, como a Nokia e a Ericsson, poderão, em teoria, ser também excluídas das redes 5G. Este facto é muito relevante e revela que, aparentemente, Portugal está a ir mais longe, no decoupling face à China, do que a maioria dos países europeus, numa altura em que Washington aumenta a pressão para que Lisboa feche a porta ao capital e à influência chinesa. Coincidência ou não, a decisão foi aprovada poucos dias depois de uma reunião do grupo Bildenberg que trouxe ao nosso país o secretário geral da NATO e várias outras figuras de relevo do establishment euro-atlântico.

Por outro lado, a importância desta deliberação vai além do mercado das telecomunicações, devido às consequências que dela poderão resultar para as relações entre Portugal e a China.

Desde 2013, a China tem investido muitos milhares de milhões de euros no nosso país, nas privatizações da EDP e da REN, na compra de bancos, seguradoras e outras empresas de vários sectores. Muitos investidores chineses compraram casas em Portugal ao abrigo dos vistos gold e o nosso Governo sempre manifestou publicamente o seu apreço por esta ligação especial ao colosso asiático.

As tensões geopolíticas dos últimos anos e a transformação em curso do processo de globalização, com a divisão do mundo em blocos geopolíticos e económicos rivais, obrigou o Governo português a dar o dito por não dito. Ainda é cedo  para saber se este volte face se vai aplicar também às duas joias da coroa do investimento chinês em Portugal, a EDP e a REN, mas muito provavelmente a reação de Pequim seria mais musculada nesse caso.

As próximas semanas serão cruciais para saber se o Governo de António Costa terá, mais uma vez, a habilidade diplomática necessária para preservar a relação com a China, sem pôr em causa os compromissos com os aliados ocidentais.