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Voltou a guerra entre a União Europeia e o Reino Unido

A União Europeia insurgiu-se contra a decisão do governo britânico de avançar com legislação para alterar unilateralmente o Protocolo da Irlanda do Norte e admite retomar ações legais contra Londres.
13 Junho 2022, 17h55

Como era de esperar, a União Europeia insurgiu-se contra a decisão desta segunda-feira tomada pelo governo britânico de avançar com legislação para alterar unilateralmente o Protocolo da Irlanda do Norte e admite retomar ações legais contra Londres, que acusa de ter comprometido o “espírito de cooperação”.

Numa declaração à imprensa em Bruxelas, sensivelmente ao mesmo tempo que o governo de Boris Johnson apresentava em Londres a sua proposta de lei, o vice-presidente da Comissão responsável pelas Relações Interinstitucionais (e pelo ‘pós-Brexit’), Maros Sefcovic, disse que é com “significativa preocupação” que Bruxelas toma nota da decisão britânica de avançar com legislação que ‘atropela’ “elementos centrais” do Protocolo, “parte integrante do Acordo de Saída” negociado longamente entre UE e Reino Unido no quadro do ‘Brexit’.

Reiterando que “a União Europeia não irá renegociar o Protocolo”, já que tal “é irrealista”, pois durante as longas negociações com Londres sobre o Acordo de Saída “não foi encontrada qualquer solução alternativa viável para este equilíbrio delicado” e “qualquer renegociação iria simplesmente trazer mais incerteza jurídica para as pessoas e empresas na Irlanda do Norte”, Sefcovic voltou a lamentar esta “ação unilateral” de Londres, que, sublinhou, “é prejudicial à confiança mútua”.

Segundo o vice-presidente, “a Comissão irá agora avaliar o projeto de legislação do Reino Unido”, com o objetivo de sempre, o de “assegurar a implementação do Protocolo”, e a “reação à ação unilateral do Reino Unido refletirá esse objetivo e será proporcional”, tendo Sefcovic acenado desde já com a possibilidade de o executivo comunitário recorrer à Justiça para garantir o cumprimento de compromissos juridicamente vinculativos.

“Como primeiro passo, a Comissão considerará prosseguir oo processo por infração iniciado contra o governo do Reino Unido em março de 2021. Tínhamos suspendido esta ação legal em setembro de 2021, num espírito de cooperação construtiva para criar o espaço de procura de soluções conjuntas, mas a ação unilateral do Reino Unido vai diretamente contra este espírito”, disse então.

A decisão de Londres não terá apanhado de surpresa a cúpula dos 27. Há pouco menos de um mês, o governo britânico anunciou que pretendia introduzir legislação “nas próximas semanas” para anular unilateralmente aspetos do Protocolo negociado como parte do ‘Brexit, mas continuará a discutir a sua reforma com a União Europeia.

Na altura, a ministra dos Negócios Estrangeiros britânica e negociadora-chefe, Liz Truss, disse na Câmara dos Comuns que a “preferência” de Londres continua a ser “uma solução negociada com a União Europeia” e que “não se trata de desmantelar o protocolo.

Segundo o governo britânico, a atual implementação do protocolo coloca o chamado Acordo de Paz de Sexta-feira Santa, assinado na Páscoa de 1998 e que pôs fim a décadas de conflito armado no Ulster (nome atribuído à Irlanda do Norte), “sob pressão”.

Sob pressão está também por certo o próprio governo, que entretanto viu na Irlanda do Norte a vitória de um partido que se opõe abertamente á união com o Reino Unido, o Sinn Fein – e esse terá sido, segundo os analistas, o que fez acender as luzes vermelhas no interior do gabinete de Boris Johnson.

Liz Truss disse esta tarde que o novo projeto de lei resolverá problemas comerciais pós-Brexit, mas especialistas jurídicos e alguns parlamentares conservadores dizem que a medida viola o direito internacional. É essa a leitura da União Europeia.

Entre outras medidas, a nova legislação pretende eliminar a competência do Tribunal de Justiça da UE (TJUE) sobre litígios relacionados com a Irlanda do Norte. O texto apresentado por Liz Truss contempla a criação de uma “via verde” que isentaria do controlo aduaneiro de mercadorias provenientes da Grã-Bretanha destinadas ao consumo na Irlanda do Norte, embora mantivesse uma “via vermelha” reservada aos produtos destinado à República da Irlanda, integrado no mercado comunitário único.

Da mesma forma, propõe que as empresas que apenas comercializam com a Irlanda do Norte possam escolher se são regidas por regulamentação comunitária ou britânica, e prevê ainda que os subsídios e desonerações fiscais em vigor no resto do território britânico possam ser aplicados naquela província.

Para Londres, a proposta é uma “solução prática e razoável para os problemas enfrentados pela Irlanda do Norte”, embora esteja disposto a desistir do projeto se as negociações com a UE produzirem um resultado aceitável para todas as partes.

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