O custo dos combustíveis vai subir até 2 cêntimos por litro (gasolina), devido à incorporação de mais “biocombustível”, o mesmo “biocombustível que contém óleo de palma”, o mesmo óleo de palma que tem sido responsável por uma boa parte da desflorestação em algumas zonas do planeta, como a Indonésia, agravando assim o problema das alterações climáticas, para não falar no desaparecimento de centenas de milhares de espécies animais, algumas em vias de extinção. Estamos portanto a pagar mais para destruir o nosso planeta de forma mais célere.

Este é um dos vários exemplos em que o bom senso é atropelado pelo senso criado pela máquina de propaganda dos populistas, especialmente através das redes sociais. Estamos na fase em que basta a existência de uma palavra categorizada como “boa” numa sentença para que, automaticamente, o acto seja por nós aceite como o correcto.

Se tal acontece pelo elevado ritmo de vida que levamos ou pela intenção de enredar pela facilidade de pensamentos, para não nos dificultar mais o dia-a-dia, é um tema que merece a devida reflexão, porque senão estaremos a negar tudo o que nos tem permitido evoluir enquanto civilização, nomeadamente a importância da validade do método científico e do questionar constantemente o statu quo.

Outro tema que está na moda e que pouco ou nada tem seguido os princípios do bom senso é a questão da poluição por parte do plástico e as suas ramificações no tópico dos sacos de plástico e de papel. Desde logo recordo o artigo de opinião que escrevi, que enquadra o principal problema do plástico, a poluição nos oceanos, que posso resumir nesta frase: “Podemos afirmar que cerca de 90% do plástico nos oceanos advém de apenas dez rios, oito dos quais na Ásia e dois em África”, adicionando a opinião de Erik Solheim, chefe da UN Environment, “o problema não é o plástico, é o que fazemos com ele, sendo que reciclamos muito pouco – em 2015, foram apenas 14%”.

Entrando agora na questão dos sacos, foi anunciado recentemente que a cadeia de retalho LIDL deixou de ter os sacos de plástico feitos com pelo menos 80% de material reciclado, para passar a ter apenas sacos de papel com pelo menos 50% de material reciclado. E sobre esta anormalidade científica há muito para dizer, porque a resposta sobre qual o melhor não é, nem pode ser, simplista e muito menos populista.

Começo pelo facto óbvio de que por cada saco de papel que consumir ao invés de um saco de plástico vou estar a ajudar a destruir o nosso maior aliado contra as alterações climáticas, as árvores, que como referi no artigo acima, “em 2017 desapareceu, por segundo, o equivalente a um campo de futebol de floresta”.

Não há um único estudo científico credível que indique inequivocamente a primazia do saco de papel sobre o saco de plástico no caso de uma única utilização, nem sequer duas! E há vários estudos que explicam porquê. Um deles, efectuado pela Environment Agency (Reino Unido), explica razoavelmente o tema. Para um saco de papel ser melhor para o ambiente que um saco de plástico, o de papel tem de ser utilizado pelo menos três vezes e o de plástico apenas uma.  Mas se o saco de plástico for utilizado pelo menos duas vezes (por exemplo como saco do lixo), o papel só passa a ser melhor com sete utilizações, o que é absolutamente inverosímil pois ao contrário do plástico o papel é demasiado frágil.

Um estudo do governo escocês sobre a temática de aplicar ou não um imposto aos sacos de plástico (como acontece em Portugal), referencia outro estudo efectuado pela cadeia retalhista Carrefour que não deixa margem para dúvidas. Com apenas uma utilização e comparando com o saco de plástico, para a produção de um saco de papel é necessário: 10% mais de energia de fontes não renováveis e quatro vezes mais água. Além disso, emite 3,3 vezes mais gases de efeito de estufa, contribui 1,9 vezes mais para a acidificação da atmosfera e 14 vezes mais para a eutrofização das águas, além de gerar 2,7 vezes mais resíduos sólidos.

A questão é complexa, porque aferir qual é a melhor opção depende de muitos factores para além da produção, desde logo quantas vezes vou utilizar aquele saco, mas também os efeitos ambientais do transporte de sacos do produtor para o supermercado, sendo que os de papel são muito mais pesados, logo piores para o ambiente. Mas também o tema do lixo nos aterros, onde o papel, ao contrário da ideia generalizada, não se comporta assim tão bem, dado que os aterros actuais estão feitos para que não existam as condições para que o papel, mais volumoso e pesado que o plástico, se degrade rapidamente devido à ausência de água, luz e oxigénio.

O estudo do Carrefour termina com uma conclusão clara: os sacos de plástico mais robustos, que se vendem a 50 cêntimos, são a melhor opção se utilizados pelo menos quatro vezes. Mas, na maior parte dos casos, o saco de plástico, com uma a duas utilizações – com 80% de material reciclado contra os 50% do papel – é sem dúvida uma melhor opção.

De novo, e tal como na questão dos combustíveis, estamos a ajudar a destruir o nosso planeta de forma mais célere, com medidas sem qualquer bom senso. Onde nos devemos concentrar é no aumento da percentagem de resíduos que reciclamos, pois é aí que reside uma boa parte da solução, só que como em quase todos os problemas que têm tido com más soluções, dá mais trabalho, tanto para os cidadãos, como para o Estado. E Portugal, nesse campo, está muito atrás: apenas 28,4% dos resíduos municipais urbanos são reciclados (Pordata), contra os 46,4% de média da UE28.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.